Logo Folha de Pernambuco

MARCONNY FARIA

Lobista na mira da CPI recebia núcleo de Bolsonaro para passeios de lancha e churrascos

O depoimento de Marconny está marcado para quarta-feira (15) na CPI da CovidO depoimento de Marconny está marcado para quarta-feira (15) na CPI da Covid - Foto: Pedro França/Agência Senado

Mensagens enviadas à CPI da Covid revelam que o lobista Marconny Albernaz de Faria, apontado como um intermediário da Precisa Medicamentos, mantinha relação com o núcleo familiar e uma advogada de Jair Bolsonaro.

O material expõe eventos realizados na casa de Marconny, em Brasília, como churrascos e passeios de lancha. O lobista ainda se dispunha a cuidar da agenda de pessoas do círculo do presidente, com o agendamento de consultas médicas e horário em salão de beleza.

As mensagens de aplicativo mostram ainda a proximidade dele com Ana Cristina Valle, ex-mulher de Bolsonaro, com o filho 04 do presidente, Jair Renan Bolsonaro, e com a advogada Karina Kufa.

A Precisa Medicamentos está no centro das investigações da CPI por suspeita de irregularidades nas negociações da vacina indiana Covaxin. O Ministério da Saúde decidiu encerrar o contrato de R$ 1,6 bilhão com a empresa para a compra de 20 milhões de doses do imunizante.

Procurada, Ana Cristina, que também é mãe de Jair Renan, não respondeu aos questionamentos da reportagem. Kufa afirmou, em nota, que nunca escondeu a amizade com Marconny, que, por sua vez, por meio de advogados, disse que as mensagens foram distorcidas.

As informações constam de conversas no WhatsApp, entre Marconny e pessoas ligadas a Bolsonaro, obtidas pela CPI após quebra judicial de sigilo do lobista a pedido do MPF (Ministério Público Federal) no Pará. A reportagem teve acesso ao material.

Pelas mensagens, Kufa e o lobista chamavam um ao outro de amigos. Ela já o encontrou em diversos momentos, frequentaram a casa um do outro e marcaram almoços em diversas oportunidades.

A proximidade dos dois era tamanha que a advogada chegou a compartilhar foto do filho dela com o lobista no WhatsApp. As mensagens indicam que Kufa levou a criança em evento na casa do lobista.

Em uma das mensagens, de maio de 2020, a advogada de Bolsonaro aceita o convite para dar uma volta de lancha. "Borá andar de lancha???", diz Marconny. Em seguida Kufa responde com três mensagens: "Bom dia"; "Vamos!"; "To precisando tirar a tensão da cabeça".

Maconny também marcou duas vezes médico para a advogada e até disse que iria com ela a uma das consultas. "Marquei pra manhã seu médico às 17h. Vou com vc!!!", afirmou em uma mensagem de junho de 2020.

A assessoria de Kufa, em nota, disse que não negou a proximidade dela com o advogado. Afirmou ainda que a advogada não tem relação com representantes da Precisa e nunca ouviu o termo "lobista" associado a Marconny.

"Ao que tudo indica, esse rótulo foi inaugurado na CPI. Ele é uma pessoa conhecida no meio jurídico em Brasília", disse a assessoria.

Assim como Karina, a ex-mulher Bolsonaro tinha proximidade com o lobista. As mensagens indicam que Valle também já almoçou na casa de Marconny em pelo menos uma ocasião.

Foi o lobista que a convidou, em 31 de agosto de 2020, para ir ao casamento da advogada Anna Carolinna Noronha, filha do ministro e ex-presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça) João Otávio Noronha: "Marque na sua agenda"; "Casamento da Filha do min Noronha"; "Já falei com o Renan"; "Quero que venha"; "Vai ser toppp!!!"; "Só a nata da corte .... muito selecionado".

A relação de proximidade fica evidente nas trocas de mensagem. O lobista chegou a marcar serviços de cabelo e maquiagem para Valle. Ela, inclusive, se arrumou na casa dele antes de ir ao evento."As profissionais vão vir aqui pra casa", diz Marconny. "Vai arrumar vc a Tati e a Karina Kufa", afirma.

A ex-mulher do presidente ainda foi de carona, no carro do lobista, para a festa de casamento. "Bom dia meu querido gostaria de saber se posso ir com vcs no carro pois o Renan tem um compromisso às 16 e depois ele vai direto", diz Valle, em 12 de setembro do ano passado.

Valle pediu ao lobista ajuda ao seu filho, mas sem dizer do que se tratava. A mensagem foi encaminhada no dia 14 de setembro de 2020, três dias antes de Marconny procurar Jair Renan para dar prosseguimento à abertura de uma empresa. Como a Folha revelou, a empresa de Jair Renan, a Bolsonaro Jr. Eventos e Mídia, foi aberta com a ajuda do advogado.

De acordo com os diálogos, o lobista e Jair Renan começaram a tratar do tema no dia 17 de setembro de 2020, quando Marconny lhe escreveu: "Bora resolver as questões dos seus contratos!! Se preocupe com isso. Como te falei, eu e o William estamos a sua disposição para ajudar te ajudar", disse.

A mensagem trata de William de Araújo Falcomer dos Santos, que Marconny representa na CPI da Covid. Jair Renan então respondeu: "Show irmão. Eu vou organizar com Allan a gente se encontrar e organizar tudo".

Em seguida, o filho do presidente diz que precisa abrir um processo para registrar no INPI (Insituto Nacional de Propriedade Industrial) as marcas e patentes e abrir o MEI como microempreendedor.

No mesmo dia, o lobista mandou uma mensagem para Santos, para marcar uma reunião entre ele e o filho do presidente. Frederick Wassef, advogado de Jair Renan, frisou que não existe relação de negócio ou amizade, mas contou que o filho do presidente foi apresentado a Marconny por Santos.

"Renan é uma pessoa pública e volta e meia está em eventos, em festas e tem muitos conhecidos, é comum que ele conheça várias pessoas. Conheceu esse advogado no começo de 2019 e não tem e nunca teve qualquer tipo de relação com ele", disse.

As conversas também expõe pedidos de Marconny ao círculo próximo de Bolsonaro. Ele pediu ajuda a Valle para influenciar na escolha do defensor público-geral da União em 2020.

Marconny também fez pedido semelhante a Kufa. O lobista queria a ajuda da advogada para fazer a indicação de uma pessoa na diretoria do Instituto Evandro Chagas. As mensagens foram trocadas no dia 25 de maio de 2020.

"Que dia podemos ver a situação do instituto Evandro chagas!?", diz Marconny; "Temos que tirar os petralhas logo de lá."
Em seguida, a advogada de Bolsonaro responde: "Agora". Ele então diz: "Show". Na sequência a advogada fala: "Vou lá falar sobre isso nesse momento".

A assessoria de Kufa disse que Marconny teria encaminhado um currículo argumentando ser uma pessoa tecnicamente qualificada. A advogada, no entanto, afirmou não ter dado prosseguimento ao pedido.

"Esse tipo de indicação é feita rotineiramente pelas pessoas, o que é natural. A decisão é sempre do presidente", disse a assessoria, em nota. Marconnny também participa de alguns grupos de WhatsApp em comum com o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho mais velho de Bolsonaro.

Santos, advogado de Marconny, disse, em nota, que por causa da apreensão do celular do cliente, em outubro de 2020, tem havido divulgação indevida e distorcida de conversas.

"Foram feitas distorções maldosas em relação aos nomes da advogada Karina Kufa e Ana Cristina Valle", afirmou o advogado. Segundo ele, "as duas não tiveram qualquer participação" nas atividades profissionais de Marconny.

Santos disse ainda que Marconny não negociou vacina com o Ministério da Saúde ou qualquer outra área do governo. De acordo com o advogado, Marconny conversou com uma colega, em maio de 2020, para tratar da possibilidade de se viabilizar a venda de testes de Covid entre entidades privadas.

"Isso não dá o direito a ninguém de fazer acusações inverídicas. Não há qualquer referência nos diálogos a dinheiro público. Não há qualquer irregularidade nas tratativas entre as duas partes", afirmou.

Em diálogos de posse da CPI, Marconny discutiu, em junho de 2020, a venda de 12 milhões de testes rápidos pela Precisa Medicamentos ao Ministério da Saúde.

A CGU (Controladoria-Geral da União) apontou evidências de tentativa de interferência no processo de chamamento público para a contratação com a ajuda de Roberto Dias, ex-diretor de Logística da pasta, para beneficiar a Precisa.

O depoimento de Marconny está marcado para quarta-feira (15) na CPI da Covid. Já na terça-feira (14) é a vez de Marcos Tolentino da Silva. O empresário entrou no radar da comissão devido à suspeita de que seja um sócio oculto da FIB Bank, empresa usada pela Precisa Medicamentos para oferecer uma carta de fiança ao Ministério da Saúde em negociação para a compra da vacina indiana Covaxin.

A comissão ainda não definiu quem prestará depoimento na quinta-feira (16). O depoimento da advogada Karina Kufa estava previsto para ocorrer nesta semana. No entanto, ainda não houve concesso entre membros da comissão se ela será ouvida ou não.

Veja também

Militares indiciados pela PF queriam arrastar promotor e deputados para gabinete do golpe
OPERAÇÃO CONTRAGOLPE

Militares indiciados pela PF queriam arrastar promotor e deputados para gabinete do golpe

Governadora Raquel Lyra anuncia licitação para duplicação de trecho da BR-232
PE na Estrada

Governadora Raquel Lyra anuncia licitação para duplicação de trecho da BR-232

Newsletter