MPRJ e Polícia Civil investigam denúncias contra Gabriel Monteiro
Assessores e ex-assessores acusam o vereador do Rio de assédio moral e sexual, manipulação de vídeos e exploração de criança para autopromoção
O vereador, youtuber e ex-policial militar Gabriel Monteiro — que entre uma série de controvérsias costuma ser visto com uma escolta armada de PMs com fuzis — agora será investigado pelo Ministério Público do Rio (MPRJ) e pela Polícia Civil, em desdobramentos das denúncias apresentadas anteontem no Fantástico, da TV Globo, nas que assessores e ex-assessores o acusam de assédio moral e sexual, manipulação de vídeos e exploração de criança para autopromoção.
Essa última imputação será alvo de um inquérito civil que a 2ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva da Infância e Juventude da capital vai instaurar para apurar se uma menina teve seus direitos violados.
Ela aparece em um vídeo do parlamentar, publicado nas mídias sociais, dizendo que naquele dia “ficaria sem comida”. Imagens sem edição exibidas pelo Fantástico, no entanto, apontam que ela teria dito aquilo após ser instruída por Monteiro. Segundo o MPRJ, podem ser adotadas medidas para a remoção do vídeo das redes sociais, sem que seja descartada a hipótese de ajuizamento de uma ação judicial para a obtenção de indenização por dano moral coletivo.
Já a delegada Giselle do Espírito Santo, da Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam) de Jacarepaguá, vai intimar o vereador a depor no inquérito, aberto anteontem, em que ele é investigado por assédio sexual a uma ex-assessora de 26 anos. Como vereadores não têm foro privilegiado, ele pode responder a processo em primeira instância.
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— É um crime grave e temos que apurar todos os detalhes — afirmou Giselle.
Luiza Caroline Bezerra Batista trabalhava para os canais do vereador na internet e afirma que algumas situações inconvenientes estão registradas nos vídeos em que ela ajudava a gravar.
“Ele me abraçava assim por trás. Beijava o meu rosto, saía de pênis ereto e ia mostrar para o segurança”, relatou a mulher ao Fantástico, ao que contou também um episódio em que teria sido agarrada, mordida e lambida pelo parlamentar. Em seu depoimento à polícia, ela confirmou as acusações. E disse que Monteiro dizia a seus assessores que ou topavam tudo ou não trabalhavam para ele.
Além do assédio sexual, o vereador é acusado de estupro por uma segunda mulher. À TV Globo, ela afirmou que consentiu o início das relações sexual com político. Mas, no meio da relação, ela pediu que ele parasse, e o ato evoluiu para um abuso sexual.
Procurado pelo Globo, Monteiro não quis se manifestar. Outros assessores também o acusam. Após dizer que foi alvo de assédio sexual, o editor de vídeo Mateus Souza, de 21 anos, disse ontem que passou a receber ameaças de morte em suas redes sociais.
— Pela carga horária, passei a morar na casa dele. Num primeiro momento, era em Icaraí. Depois, Camboinhas e, em seguida, na Barra. A gente tinha que editar os vídeos do Tik Tok e do Youtube, porque ele falava que era ligado ao parlamento —diz Mateus.
O editor conta que os assédios começaram quando eles viviam em Camboinhas.
— Ele pegava nas nossas partes íntimas, dava porrada na gente e, a partir daí, me senti desconfortável. Ele fazia piadinha de mim (de cunho homofóbico). Falava que tínhamos que tocar nele porque era um trabalho — conta Mateus, que relata o que tem vivido agora. — Estou recebendo ameaça de morte. Parte da minha família foi embora por medo. A minha esposa só chora. Tenho medo do que pode acontecer comigo. Eu temo pela minha vida.
Já outro ex-assessor, Heitor Monteiro Lobby, de 21, acusa Monteiro de instruir “a equipe a piorar a narrativa” sobre a situação de crianças que apareciam em seus vídeos:
— A equipe ia na frente para fazer a busca do perfil de crianças que ele queria e pedia: negras, carentes e com uma história triste. A partir daí, ele instruía a gente a piorar a narrativa. A gente orientava e induzia a criança a contar certo tipo de coisa que ela não estava passando naquele momento — conta Heitor.
Sobre a menina cuja participação numa das publicações de Monteiro será investigada pelo MPRJ, no domingo, após a reportagem do Fantástico, o vereador divulgou um vídeo editado com uma mulher identificada como a mãe da garota.
— O que a minha filha falou não era nada mentira. No dia que ele chegou e abordou a minha filha, era quase cinco e pouca da tarde (sic) e eu e a minha filha não tinha almoçado (sic). Eu quase desmaiei. As pessoas criticam, mas não sabem o que passamos — disse a mulher.
O advogado Matheus Falivene, especialista em Direito Penal, explica, no entanto, que independentemente de os responsáveis pela menina defenderem a posição de Monteiro e não apresentarem qualquer queixa, o MPRJ pode investigar se os direitos dela foram violados:
— Os crimes do Estatuto da Criação e do Adolescente (ECA) são de ação penal pública. Então, nesse caso, independe da vontade da vítima ou dos pais. O ECA também trabalha com o princípio da proteção integral. Ainda que não encontre um crime, o Ministério Público vai investigar porque pode haver punições administrativas. E, supondo que se entenda que há crime, possivelmente pelo menos um dos pais pode ser processado junto com o vereador.
O advogado afirma ainda que outro crime que poderia ser investigado é o de peculato, se ele utilizava funcionários pagos com dinheiro público para produzir vídeos particulares sem relação direta com a atividade parlamentar:
— É um problema que tem sido discutido com relação a policiais e políticos youtubers, que usam estrutura do estado para atividade particular.
O suposto uso indevido de funcionários públicos para fins privados também será investigado pelo MPRJ, na 3ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Defesa da Cidadania da Capital.
“Por fim, o Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Investigação Penal (CAO Investigação Penal/MPRJ) informa que aguarda iniciativa de apresentação das denúncias por parte das supostas vítimas de assédio e estupro, citadas na reportagem, para atuação nos casos. Cabe lembrar que, nos episódios de assédio ou estupro cometidos contra adultos, é necessário que as próprias vítimas prestem queixa. Por força da Legislação, e em respeito ao princípio de proteção do direito à intimidade das vítimas, o MPRJ só pode atuar nesses casos quando provocado”, afirma em nota.
Parte da minha família foi embora por medo. A minha esposa só chora. Tenho medo do que pode acontecer comigo. Eu temo pela minha vida.