Investigação

MPT apura denúncias de assédio eleitoral contra prefeitos, representantes legislativos e de governos

Eles são denunciados por pressionar e ameaçar funcionários, também de empresas privadas, a votar em seus aliados ou a evitar manifestações em favor de seus adversários

Urnas eletrônicasUrnas eletrônicas - Foto: José Cruz/ Agência Brasil

O Ministério Público do Trabalho (MPT) vem recebendo denúncias de que prefeitos, representantes de Casas Legislativas e de governos estaduais têm praticado assédio eleitoral contra servidores, trabalhadores terceirizados e até empregados de empresas privadas nesta reta final das eleições. Há relatos de pressões e ameaças em diversos estados do país para que trabalhadores votem em determinado candidato a presidente ou evitem manifestações em favor do outro.

Em Rio Verde (Goiás), cidade a 232 quilômetros de Goiânia, o alvo das denúncias é a vereadora Nayara Barcelos, do PRTB, que já apareceu em fotos ao lado do presidente Jair Bolsonaro (PL), da primeira-dama, Michelle Bolsonaro, e da ex-ministra e senadora eleita Damares Alves (Republicanos-DF). Ela esteve em ao menos duas empresas, uma do setor agrícola e uma concessionária, onde disse que o governo do PT “chamava meninos de meninas e meninas de meninos”, como mostra um vídeo do evento.

"Acontecia nesse governo passado. Chamava criança de 4 anos, chamava o menino e dizia para ele que era uma menina. Chamava uma menina e dizia para ela que ela era um menino", afirmou diante de 30 funcionários na última quarta-feira.

Chamado nas redes
A visita à concessionária fez parte de uma iniciativa da vereadora batizada de “conscientização política”, divulgada em banners em redes sociais. No anúncio, lê-se: “Atenção empresários e produtores rurais. Precisamos que vocês abram suas empresas, para uma equipe de conscientização das eleições 2022, faça uma visita e tenha uma reunião com seus funcionários”.

Nayara também foi filmada durante uma explanação numa empresa agrícola. Na ocasião, afirmou que governos do PT promoviam a “ideologia de gênero”. Ao GLOBO, ele alegou que não pediu votos a ninguém.

"Em momento nenhum pedimos votos para o candidato A ou para o B nem falamos se fulano é mais bonito ou mais feio", disse Nayara, que cessou as visitas após ser intimada pelo Ministério Público. "Fui acionada hoje. Não vai mais ter agenda."

Em Portelândia, município de quatro mil habitantes também em Goiás, o MPT investiga um encontro entre a prefeita Marly Rodrigues, do Republicanos, partido da base de apoio do presidente da República, e funcionários da prefeitura no qual ela pede votos em favor de Bolsonaro.

Em um vídeo gravado na ocasião, Marly relata uma reunião em que estavam outros prefeitos de Goiás, o governador do estado, Ronaldo Caiado (União), também aliado do presidente, e o próprio Bolsonaro, em Brasília. Ela afirma que “passou vergonha” porque a sua cidade deu mais votos a Lula no primeiro turno, e fez uma ameaça aos servidores em caso de vitória do petista.

"Se isso acontecer (Lula se eleger), nessa gestão, eu vou embora em janeiro, ou eu vou ter que reduzir o quadro de funcionários. Se o Lula ganhar, ele não repassa (recursos). A gente tem que receber do governo federal", disse no encontro, ocorrido há duas semanas.

O caso é investigado pelo MPT de Goiás. Ao GLOBO, ela admitiu ter pedido votos.

"É um direito nosso. Fiz comparativos e expliquei a situação em que pode ficar o Brasil no caso de o adversário ganhar ", reiterou a prefeita.

Em Minas Gerais, o prefeito de Carandaí, Vasiquinho Gravina (PSD), protagonizou situação semelhante. Num áudio compartilhado com funcionários comissionados da prefeitura, ele avisa que a vitória do candidato petista pode acarretar atraso do salário dos servidores municipais.

"Então, se o PT ganhar e atrasar os repasses para o município, eu vou atrasar o salário de todo mundo. Eu tinha um compromisso com aqueles que estão comigo, aqueles que não estão, não tenho compromisso nenhum", disse ele.

Gravina foi denunciado ao MPT por assédio eleitoral e se retratou nas redes sociais depois de firmar um acordo com os procuradores. O prefeito publicou uma nota oficial em que diz que sempre respeitou os preceitos constitucionais. No comunicado, afirma ser contra qualquer forma de assédio a trabalhadores que prestam serviços ao município.

Procurado pela reportagem do GLOBO, entretanto, Vasiquinho Gravina argumentou que foi apenas mal interpretado:

"Eu e meu vice decidimos apoiar um candidato e lançamos uma arte nas redes sociais. Alguns dos cargos de confiança não aceitaram e me criticaram. E interpretaram mal. Eu sou um prefeito sempre democrático."

Pressão petista
A pressão a servidores não é exclusividade de aliados do presidente da República. Um dos casos apurados envolve o uso da máquina da prefeitura de Fortaleza em prol da campanha de Luiz Inácio Lula da Silva. A cidade é governada por Sarto Nogueira, do PDT, partido que engrossou o palanque de Lula no segundo turno da disputa presidencial. Um advogado apresentou uma ação à Justiça Eleitoral do Ceará em que acusa a Secretaria de Educação de ter organizado um evento com professores do município para promover a campanha do petista.

O órgão pagou R$ 176 mil pelo aluguel do Centro de Eventos do Ceará para a realização de uma atividade batizada de Outubro Docente, em que participantes teriam discursado em favor de Lula, segundo a denúncia. Ainda não houve despacho da Justiça Eleitoral sobre o pedido. Em um vídeo do evento anexado ao processo, uma banda toca uma música alusiva a Lula. A denúncia sustenta ainda que havia a distribuição de bandeiras e adesivos do petista.

"Falta só mais um pouquinho para o Bolsonaro acabar. Vai acabar, tem que acabar", afirmou, no palco, uma pessoa que estava ao microfone.

Procurada pela reportagem, a Secretaria Municipal da Educação de Fortaleza disse que o referido caso ocorreu durante atividades culturais realizadas no evento. Afirmou ainda que “não compactua com manifestações políticas com fins eleitorais de nenhuma natureza” e que “está tomando todas as providências para coibir novas irregularidades”.

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