"Nossa atuação incomodava vida das milícias", diz Tarcísio Motta após afirmação de Lessa
Segundo Lessa, os irmãos Brazão infiltraram o paramilitar Laerte Silva de Lima e a mulher no partido para acompanhar os passos da vereadora Marielle Franco e de colegas da sigla
Em entrevista ao Globo, o deputado federal Tarcísio Motta declarou, nesta segunda-feira, que o assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, em 2018, foi uma tentativa de intimidar o PSOL. O parlamentar ressalta que a atuação do partido era vista como um obstáculo na expansão territorial da milícia no Rio. Em delação à PF, Ronnie Lessa afirmou que o plano de espionar a sigla não mirava apenas Marielle, mas também outros políticos: Marcelo Freixo, Tarcísio Motta, Chico Alencar e Renato Cinco.
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— Essa é uma informação que já circulava antes da fala dele. Nós já sabíamos das pesquisas que ele tinha feito na internet sobre o PSOL e também que a nossa atuação incomodava a vida das milícias no Rio. Eles fizeram isso para nos intimidar, porém aí mesmo que nós não podíamos nos calar. Eles venceriam se nós fizéssemos isso. A Marielle era a minha querida companheira e dói em mim toda vez que falo dela. No entanto, também tiro muita força para conseguimos derrotar esse mal que assola o território do Rio — diz Tarcísio Motta.
Na delação, Ronnie Lessa assume que aceitou fazer parte do plano de assassinar a vereadora, proposto pelos irmãos Brazão, mandantes do crime, de acordo com ele. Em troca, ganharia dois loteamentos em Jacarepaguá, que renderia mais de 20 milhões de dólares em lucro, equivalente a R$ 100 milhões.
— Eu não sei quais territórios seriam esses que o Lessa ganharia, mas a forma como a milica age, avançando sobre áreas de proteção ambiental, são repreendidas pelo PSOL. Nós defendemos que não haja grilagem e lutamos por isso. Ele citou o Renato Cinco, por exemplo, e é alguém que atua bastante nessa questão urbanística. Tudo nos leva a crer que queriam nos amedrontar porque éramos um obstáculo — destaca Tarcísio Motta.
Infiltrados no partido
Durante o depoimento à PF, Lessa afirmou que os irmãos Brazão infiltraram Laerte Silva de Lima e a mulher, Erileide Barbosa da Rocha, no PSOL. O casal era um “braço armado” da milícia de Rio das Pedras, na Zona Oeste do Rio.
“O Domingos [Brazão], por exemplo, não tem papas na língua. Ele simplesmente fala que... ele colocou, digamos assim, um espião no PSOL, no partido da Marielle. E o nome desse espião seria Laerte, que é uma pessoa do Rio das Pedras, que depois eu soube se tratar de um miliciano. Uma pessoa responsável por várias atividades da milícia lá. E essa pessoa trazia informações para os irmãos com relação ao PSOL em si”, declarou Lessa.
A filiação de Laerte e Erileide aconteceu em abril de 2017, quando Lessa começou a fazer buscas na internet pelo nome de Marcelo Freixo — na época, uma das figuras mais atuantes do PSOL. Em 2019, Lessa admitiu em depoimento ao Ministério Público do Rio (MPRJ) ter pesquisado na internet informações sobre o então deputado federal.
“Em 2017, ele veio com um assunto relacionado com Marcelo Freixo. (...) É uma coisa bem ampla, pesada, que mexe com partidos. (...) Fui tirando isso da cabeça dele. Aí ele aceitou, não cobrou mais. Ali foi talvez a nossa primeira entrada com relação a crime", destacou Lessa.
O PSOL declarou que o casal foi expulso do partido em dezembro de 2020. “Sua real atuação já era de conhecimento do partido desde meados de 2019, mas não foram tomadas iniciativas estarem sob investigação. Os fatos mostram que as milícias não possuem limites em sua atuação criminosa e contam, por muitas vezes, com o apoio de agentes do Estado, quando eles próprios não o são”, disse, em nota.
Quem é Laerte
Miliciano de Rio das Pedras, Laerte foi preso em 2019, no âmbito da Operação Intocáveis, que surgiu como um desdobramento das investigações do caso Marielle. Em 2020, ele teve direito à liberdade condicional. Mas, no final de 2023, voltou a ser preso em uma ação do MP contra a milícia de Rio das Pedras.
De acordo com as investigações, Laerte era um dos principais responsáveis pelo recolhimento e repasse das taxas pagas pelos comerciantes e moradores da região. Ele também atuava no ramo de agiotagem, fundamental para os negócios da organização criminosa.