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CPI DA COVID

Omissão no número de mortes e kit Covid: entenda as acusações contra a Prevent Senior

Alvo da CPI da Covid, diretor da Prevent confirmou que retirava menção a Covid de fichas de pacientes internados há mais de duas semanas

Batista Júnior, diretor-executivo da Prevent Senior, em depoimento na CPI da PandemiaBatista Júnior, diretor-executivo da Prevent Senior, em depoimento na CPI da Pandemia - Foto: Pedro França / Agência Senado

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Em depoimento ontem à CPI da Covid, o diretor executivo da operadora da Saúde Prevent Senior, Pedro Benedito Batista Júnior, admitiu que a empresa alterava os prontuários de pacientes infectados pelo coronavírus, mas sustentou que a informação constava nos atestados de óbitos daqueles que não resistiam à doença. Dois casos concretos, porém, contradizem a versão do depoente, que irritou os senadores, que e foi incluído na lista de investigados do colegiado.

Os dois episódios que botam a tese do depoente na berlinda são públicos. Tanto o médico Anthony Wong, que era defensor do uso de medicamentos como hidroxicloroquina no combate à Covid-19, tratamento comprovadamente ineficaz, quanto a mãe do empresário bolsonarista Luciano Hang morreram em hospitais da Prevent Senior em decorrência da enfermidade. Nos documentos que atestam esses óbitos, o diagnóstico de coronavírus foi omitido. O caso foi antecipado pela revista “Piauí”. Procurada, a empresa alegou que não poderia fornecer qualquer informação a respeito de pacientes por “limitações éticas e legais”, mas disse que não houve fraudes ou omissões nos atestados.

O Ministério da Saúde determinou, desde o início da pandemia, que as certidões incluam o vírus como causa da morte. Eventuais complicações derivadas da infecção também podem ser citadas, mas a causa originária deve estar descrita no atestado. Especialistas ouvidos pelo GLOBO afirmam que a prática admitida pela operadora é absolutamente reprovável.

Durante a sessão, os senadores da CPI acusaram a Prevent Senior de se utilizar de omissões como essas para maquiar os resultados que os hospitais da rede obtinham com o chamado tratamento precoce em pacientes de Covid-19. Os métodos adotados pela operadora alçaram o caso a um dos principais temas investigados pela comissão até aqui. Reportagem da GloboNews revelou na semana passada que a empresa omitiu a ocorrência de mortes de pacientes submetidos a tais práticas, sem que eles soubessem. Um grupo de médicos que teria trabalhado para a operadora entregou um dossiê à comissão com uma série de denúncias.

Membros da CPI que são médicos de formação, como Otto Alencar (PSD-BA), Humberto Costa (PT-PE) e Rogério Carvalho (PT-SE), foram os mais enfáticos nas críticas ao depoente.

— Inacreditável. O senhor não tem condição de ser médico com a desonestidade do que fez agora. Mudar o código de uma doença é crime — afirmou Otto Alencar.

O relator, Renan Calheiros (MDB-AL), apresentou uma mensagem da Prevent Senior sobre como os pacientes eram classificados ao serem internados. Se havia suspeita ou confirmação de contaminação do coronavírus, passava a constar a CID, que é a sigla para identificação internacional de doenças, da Covid-19. Passado algum tempo dentro do hospital, a orientação era mudar o código.

“Após 14 dias do início, pacientes de enfermaria, apartamento, ou 21 dias, pacientes com passagem em UTI, leito híbrido, o CID deve ser modificado para qualquer outro, exceto B34.2, para que possamos identificar os pacientes que já não têm mais necessidade de isolamento. Início imediato”, diz uma mensagem enviada pela empresa a médicos da rede.

O executivo confirmou a informação, mas disse que a alteração do prontuário tinha como único propósito reclassificar a condição do paciente, para tirá-lo do isolamento reservado exclusivamente àqueles que tivessem contaminados. Se ele viesse a óbito, a Covid-19 continuaria sendo considerada a causa da morte, argumentou.

— Todos os pacientes com suspeita ou confirmação de Covid, na necessidade de isolamento, quando entravam no hospital, recebiam o B34.2, que é o CID de covid. E, após 14 dias, ou 21 dias para quem estava em UTI, o CID podia ser modificado, porque não representavam mais risco para a população do hospital — afirmou Batista Junior.

Fontes das cúpulas de grandes hospitais afirmaram ao GLOBO que a praxe médica é manter no prontuário dos pacientes o código da doença que motivou o tratamento, mesmo passado o período de quarentena. O mesmo vale para o registro na certidão dos que vêm a óbito.

O professor de Medicina da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) e pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Julio Croda considera grave a subtração de dados do prontuário:

— A omissão é um procedimento incomum e incorreto, principalmente de doenças infecciosas. Não tem sentido suprimir o motivo da admissão no hospital. Isso gera subnotificação, porque o que vai ser reportado é que morreu de sepse ou falência múltipla de órgãos secundária a uma infecção hospitalar.

Professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), a epidemiologista Ethel Maciel reforça os impactos negativos:

— É uma informação falsa, e isso vai fazer com que todas as informações do ponto de vista de saúde pública fiquem prejudicadas.

O Ministério Público de São Paulo quer que a Prevent Senior suspenda a prescrição do tratamento precoce em suas unidades e pague uma indenização por danos morais coletivos.A promotoria de Saúde tem uma reunião marcada com a operadora para semana que vem, quando será proposto um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), que pretende sanar alguns dos problemas que vieram a tona na CPI da Covid-19.

Além disso, o MP pedirá a paralisação de qualquer estudo clínico relacionado com a pandemia.

Quando começou a suspeita de que poderia estar com Covid, em um domingo de março deste ano, Elvira Clemente, de 84 anos, foi em busca de atendimento em uma unidade da Prevent Senior na Zona Leste de São Paulo, onde mora. Ao final da consulta, já com a confirmação da infecção, a médica ofereceu um “kit” com vitaminas, suplementos alimentares e medicamentos sem eficácia comprovada contra a Covid, como a cloroquina.

Elvira recusou o kit, para surpresa da médica. Mas, segundo familiares que a acompanharam, não era raro ver nos corredores pessoas que saíam com a sacola de remédios, algumas antes mesmo de receberem o resultado positivo para Covid. As que levavam o kit assinavam um termo. Elvira não assinou. A receita com a prescrição dos remédios, acrescenta uma parente que prefere não ser identificada, tinha o nome de um médico diferente do que o que atendeu a senhora de 85 anos.

Já em casa, contam parentes, Elvira recebeu uma ligação do plano oferecendo mais uma vez o kit. Disse novamente que não queria. Dias depois, outra ligação. Nessa, Elvira acabou aceitando, e o kit foi levado por um motoboy até sua casa. Mas, de acordo com familiares, ela tomou apenas as vitaminas contidas ali.

Um dos médicos que denunciou a operadora Prevent Senior por supostas irregularidades no tratamento de pacientes durante a pandemia registrou boletim de ocorrência na Polícia Civil de São Paulo. O médico Walter Correa de Souza Melo relata ter sofrido ameaças do diretor da operadora de saúde Prevent Senior Pedro Benedito Batista Junior. O executivo será ouvido hoje pela CPI da Covid. Pedro Batista Junior nega ter ameaçado o médico.

De acordo com o que Melo contou à polícia, Pedro Batista teria dito que o médico estaria "expondo sua filha e sua família", caso insistisse em levar o caso adiante, o que foi interpretado por ele como uma ameaça a sua família. Melo afirma ainda que o diretor proferiu frases como: "Você tá achando que é espertão?" e "Walter, olha o que você fez com a sua família!".

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