Operação da PF sobre programa espião da Abin: o que já se sabe e o que ainda falta esclarecer
Dois ex-servidores do órgão foram presos, e pelo menos outros cinco, afastados por decisão do ministro Alexandre de Moraes
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A Polícia Federal (PF) realizou, nessa sexta-feira (20), uma operação para investigar o uso de um programa secreto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) que monitorou, durante parte do governo de Jair Bolsonaro (PL), a localização de cidadãos por meio do celular. Dois servidores do órgão foram presos e exonerados no fim do dia, e pelo menos outros cinco acabaram afastados por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
O programa, cujo emprego foi revelado pelo Globo em abril, foi comprado no final da gestão de Michel Temer na Presidência e usado durante três anos no governo de Jair Bolsonaro, até maio de 2021, de acordo com a Abin. Em nota, a agência informou que colabora com as investigações.
"A Abin vem cumprindo as decisões judiciais, incluindo as expedidas na manhã desta sexta-feira. Foram afastados cautelarmente os servidores investigados. A Agência reitera que a ferramenta deixou de ser utilizada em maio de 2021. A atual gestão e os servidores da Abin reafirmam o compromisso com a legalidade e o Estado Democrático de Direito", pontuou o órgão.
Veja, abaixo, alguns pontos já conhecidos sobre o caso, e outros que ainda precisam ser esclarecidos.
O que já se sabe
Quando o programa foi comprado?
A aquisição foi feita no apagar das luzes no governo Temer, sem licitação, a um custo de R$ 5,7 milhões.
Por quanto tempo ele foi utilizado?
Segundo a Abin, o programa foi usado pelos agentes por aproximadamente 18 meses, entre dezembro de 2018 e maio de 2021.
Como funciona o programa?
Os dados são coletados por meio da troca de informações entre os celulares e antenas para conseguir identificar o último local conhecido da pessoa que porta o aparelho.
Quantas pessoas foram monitoradas?
A ferramenta da Abin permitia, sem qualquer protocolo oficial, monitorar os passos de até 10 mil proprietários de celulares a cada 12 meses. Como revelou a colunista do GLOBO Bela Megale, o sistema de monitoramento da Abin foi acionado mais de 30 mil vezes.
Quem eram os alvos?
Entre os 30 mil acionamentos, os agentes detalharam cerca de 2 mil usos relacionados a políticos, jornalistas, advogados e adversários do governo Jair Bolsonaro. A identificação de cada um, porém, ainda segue em sigilo.
Quais crimes podem ter sido cometidos?
Os investigados podem responder, na medida de suas responsabilidades, pelos crimes de invasão de dispositivo informático alheio, organização criminosa e interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei.
O que falta esclarecer
Quem eram os outros monitorados?
Como já citado, foram identificadas 30 mil ocasiões em que houve emprego do programa, mas apenas cerca de 2 mil já foram detalhados. Os registros restantes, porém, foram apagados.
Quem excluiu esses dados? Por quê?
A PF quer saber dos investigados por que essas informações foram suprimidas do sistema e por ordem de quem.
De quem partiu a ordem para que o programa fosse utilizado?
Apesar de ter sido adquirido nos últimos dias do governo Temer, o programa seguiu largamente utilizado durante a gestão de Bolsonaro, por mais de um ano. A PF apura de quem foi a autorização para que o software fosse comprado e também quem ordenou que ele passasse a ser usado pela Abin.
O que foi feito com os dados obtidos?
Outra frente da investigação busca entender qual era o objetivo do monitoramento. Além disso, os agentes querem saber ainda se os dados obtidos foram empregados com algum fim específico.
Qual a origem do dinheiro apreendido?
A PF encontrou US$ 171,8 mil — cerca de R$ 872 mil na cotação atual — em espécie na casa do diretor Paulo Maurício Fortunato Pinto, considerado o número 3 na hierarquia da Abin. Os investigadores buscam agora entender a origem do dinheiro e se ele pode ter relação com alguma atividade ilegal.
Houve omissão de outros órgãos?
Uma investigação aberta pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) concluiu que a Abin utilizou o sistema de monitoramento da localização de celulares sem o conhecimento das operadoras de telefonia. A PF apura se houve omissão de servidores do órgão regulador ou de representantes das empresas do setor.
Até o momento, dois servidores da agência foram presos e cinco afastados, enquanto US$ 171,8 mil em dinheiro vivo foram apreendidos . Segundo a colunista do Globo Bela Megale, o sistema foi acionado mais de 30 mil vezes. Desse montante, os investigadores detalharam 2.200 usos relacionados a políticos, jornalistas, advogados e adversários do governo Jair Bolsonaro.