Organizadores falam em ampliar protestos pelo impeachment de Bolsonaro
Principal cuidado é evitar associação do movimento a qualquer sigla partidária
Grupos de esquerda que capitanearam os atos contra Jair Bolsonaro, no último sábado (29), devem confirmar, nesta quarta (2), a data de novos protestos pelo impeachment do presidente sem conseguir ampliar o escopo ideológico da mobilização, apesar de demonstrarem disposição para isso.
Movimentos sociais, estudantis e sindicais, além de partidos de esquerda, agrupados em um fórum batizado de 'campanha nacional Fora, Bolsonaro', estiveram por trás das manifestações que levaram milhares às ruas em 210 cidades do Brasil e em 14 países.
Em uma tentativa de dissociar a iniciativa de entidades ou legendas, a convocação ficou a cargo de frentes como a Povo sem Medo, a Brasil Popular e a Coalizão Negra por Direitos, que reúnem centenas de entidades do chamado campo progressista.
Siglas como PT, PSOL e PC do B deram apoio e também chamaram filiados, mas enfatizaram o discurso de que a organização ficou a cargo dos movimentos sociais. A CUT (Central Única dos Trabalhadores), contrária a atos de rua agora, não fez convocação institucionalmente.
O rol de pautas foi variado e incluiu defesa da vacina, apoio à CPI da Covid-19, pedido de auxílio emergencial de R$ 600, fim da violência policial e ataque às privatizações.
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Ao reagir à pressão, Bolsonaro e seus apoiadores buscaram pintar a iniciativa como evento de campanha do ex-presidente Lula (PT), que deve disputar o Planalto em 2022 e lidera as pesquisas.
O petista não compareceu nem insuflou apoiadores para se juntarem às marchas. A presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, esteve na avenida Paulista e discursou em um caminhão de som.
Hoje uma pauta que une setores da esquerda, do centro e da própria direita, o impeachment estará no centro das reivindicações do próximo protesto, neste mês. Articuladores buscam um consenso sobre data e formato em meio ao temor relacionado à Covid-19.
"Vejo a possiblidade de ampliar [a participação] e acho que temos que trabalhar para isso", diz o presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes), Iago Montalvão. Filiado ao PC do B, ele defende esforço para atrair mais pessoas independentemente de ideologia e movimentos.
"Muita gente aderiu individualmente. É importante que os atos sejam conduzidos pelos movimentos sociais, mas têm que trazer pessoas para além da esquerda.”
Organizações mais à direita, o MBL (Movimento Brasil Livre) e o VPR (Vem Pra Rua) mantêm a decisão de não provocarem aglomerações, sob a justificativa de obediência às autoridades de saúde.
"Achamos que fica quase impossível manter regras sanitárias em manifestações. A situação ainda está grave", diz Adelaide Oliveira, que é do MBL e já foi porta-voz do VPR, dois dos grupos que puxaram multidões pelo impeachment de Dilma Rousseff (PT) .
Segundo ela, tentativas anteriores de unir as pontas ideológicas nas ruas fracassaram. Em janeiro deste ano, MBL e VPR promoveram carreatas pelo afastamento do presidente um dia após carreatas realizadas por entidades envolvidas nos atos de agora.
Além do vírus, outra razão expressa nos núcleos da direita é a resistência a se misturar aos esquerdistas. A avaliação é a de que grupos que foram capazes de aglutinar milhares de pessoas contra o PT e em apoio à Lava Jato têm capacidade, caso queiram, de galvanizar as próprias bases.
Autores dos manifestos suprapartidários que fizeram barulho, há cerca de um ano, em defesa da democracia e em contraposição aos arroubos de Bolsonaro, também optaram por manter uma distância das mobilizações de agora.
Lançado em maio de 2020 por intelectuais e artistas, o Estamos Juntos – que obteve a assinatura de políticos como o ex-presidente FHC (PSDB) e Fernando Haddad (PT) – anunciou o ato do último dia 29 em seus perfis, sem recomendar a participação.
A iniciativa também reforçou medidas sugeridas para a ocasião, como o uso de máscara do tipo PFF2 e a determinação de guardar distanciamento durante os protestos, que não foi seguida em todas as aglomerações País afora, servindo de combustível para críticas de bolsonaristas.
O Estamos Juntos está aberto a adesões, mas sua mobilização hoje se restringe às páginas em redes sociais e a grupos de WhatsApp.
Outra iniciativa da mesma época, a campanha virtual Somos 70% (em referência ao apoio de cerca de 30% dos brasileiros a Bolsonaro registrado em pesquisas) também reverberou nas redes as convocações para o sábado passado.
Seu idealizador, o economista Eduardo Moreira, diz que optou por não ir depois que uma pessoa próxima teve diagnóstico positivo para Covid-19, mas considerou válida a mobilização e aconselhou seguidores a evitarem polemizar a "decisão difícil" embutida no dilema de sair ou não às ruas.
"Tanto aqueles que vão quanto aqueles que não vão têm razões legítimas. Não devemos cair na armadilha de um elemento para dividir a oposição, em vez de fortalecê-la. Isso é o sonho da turma de Bolsonaro", afirma.
Segundo Raimundo Bonfim, que coordena a Central de Movimentos Populares, a presença de manifestantes desvinculados de organizações de esquerda teve peso no sucesso das passeatas do dia 29 e precisa ser estimulada.
"Foram muitas pessoas com esse perfil, que estavam lá porque pertencem à parcela da população que está indignada com Bolsonaro. Aderiram espontaneamente", diz Bonfim, que é filiado ao PT.
"Todos que são pelo 'fora, Bolsonaro' são bem-vindos, mas também temos lutas da classe trabalhadora, como a revogação da emenda constitucional 95 [teto de gastos] e a crítica à privatização da Eletrobras e dos Correios.”
Organizadores têm afirmado que a mobilização pela saída de Bolsonaro não se mistura a interesses para 2022. Entre partidos, mesmo siglas de centro-esquerda e de direita de oposição ao presidente evitaram engrossar as passeatas.