Partidos do Centrão e da base de Lula discutem blocos, federação e até fusão para ampliar espaços
Partido do presidente da Câmara, Arthur Lira, PP retoma tratativas com União Brasil por aliança mais duradoura. PSD e MDB avaliam atuação em bloco na Câmara, mas divergem no Senado
Após a definição das presidências da Câmara e do Senado, as legendas buscam agora a formação de blocos como forma de garantirem espaço e poder na nova configuração do Congresso.
De um lado, partidos de centro mais próximos do governo, como PSD e MDB, tentam se unir para disputar comissões e se manterem influentes nas casas. Do outro, o Centrão alinhado a Arthur Lira (PP-AL), reeleito com votação recorde, quer manter a hegemonia.
No segundo caso, além dos blocos, também há conversas para federações e fusões. O União Brasil e o PP retomaram as tratativas, paralisadas na eleição, para formar uma federação. O primeiro tem três ministérios (Turismo, Comunicações e Integração Nacional), mas quer mais espaço para dar a maioria dos 59 votos ao governo na Câmara. Juntos, os dois partidos vão somar 106 parlamentares na Casa, superando o PL, que tem 99.
No outro lado, o PSD, de Gilberto Kassab, abriu conversas para estabelecer um acordo com o presidente do MDB, Baleia Rossi, de modo a implementar uma atuação conjunta das bancadas das duas siglas. De acordo com interlocutores, o objetivo do acordo é fazer um contraponto ao fortalecimento do Centrão e aumentar seu poder de barganha com o governo federal em troca de cargos no segundo escalão.
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Quem acompanha as conversas afirma que as tratativas entre Kassab e MDB não avançaram no Senado, mas devem se viabilizar na Câmara. Caso o acordo se viabilize, a aliança pode estender à Assembleia Legislativa de São Paulo.
Até agora, as definições dos principais espaços da Câmara se deram com base em acordos entre as siglas que deram 464 votos a Lira. Esse blocão é composto por 495 de um total de 513 deputados e incluiu quase a totalidade dos partidos, com exceção de PSOL, Rede e Novo.
— Queremos o máximo possível que a reprodução dos partidos que estão no governo possa se refletir na montagem do bloco — afirma o deputado Alencar Santana (PT-SP), acrescentando que ainda não há essa definição na esquerda.
Líder do PCdoB na Câmara, o deputado Renildo Calheiros (PCdoB) acredita que a Casa caminha para definir os comandos das comissões muito por meio do blocão de Lira.
— É uma maneira de fortalecer a política e o acordo, já que anula praticamente o tamanho das bancadas. Se a negociação for separada do bloco, sempre vai privilegiar o PL, que tem a maior bancada. E foi bom para integrar o PL, para que ele não fique isolado, pois a origem do partido é o governismo e não o bolsonarismo.
No Senado, as conversas caminhavam para a formação de um bloco único da base do governo, mas ele acabou se fragmentando em dois. Um com PT, PSD e PSB, que soma 28 senadores. E outro que se tornou o maior bloco parlamentar do Senado, com 31 senadores, e inclui tanto legendas da base do governo quanto da oposição. São elas: MDB, União Brasil, Podemos, PDT, PSDB e Rede.
A costura, no entanto, gerou insatisfação. O MDB, que ficou de fora do bloco do PT, alegou que os aliados não cumpriram o acordo. Pelo Twitter, o senador emedebista Renan Calheiros (AL) reclamou da divisão e disse que MDB e União Brasil foram “furados” pelo Diário do Congresso com o bloco do PT, fazendo referência ao fato de as legendas terem sido pegas de surpresa com a aliança: “A alternativa ao fogo amigo foi criar outro bloco com 31 senadores”. Renan fazia alusão a um bloco que seria formado por 43 senadores e reuniria PT, PSD, PSB, MDB e União Brasil — a base que reelegeu Pacheco.
A senadora Eliziane Gama (PSD-MA), que migrou para o PSD, rebateu. Ela afirmou que o acordo foi desfeito porque o MDB buscou apoio de Sergio Moro (União-PR), ex-juiz federal que determinou a prisão de Lula. “Furo foi do MDB que fez acordo com a presença do líder Eduardo Braga e não cumpriu, foi pedir ajuda a Moro para ter maioria”.
Com a divisão, o PT acabou em desvantagem para a composição das comissões, que leva em conta a proporcionalidade das bancadas de blocos e partidos. A nova composição superou o bloco de 28 senadores formado por três partidos aliados: PSD, que ocupa a presidência do Senado, PT e PSB. Esse movimento pode dificultar o caminho da direita raiz, já que o PL tem em seus quadros a maioria dos parlamentares bolsonaristas e está sozinho com seus 12 parlamentares. Em campo semelhante, o bloco entre Progressistas e Republicanos terá outros dez.
Até agora, o quadro na Câmara dos Deputados é visto, afirmam aliados do presidente Lula, como mais delicado para o governo. O Palácio do Planalto ainda não tem um mapa do tamanho de sua base — o que aumenta sua dependência de Lira, com quem não pode romper, tampouco se tornar inimigo. Lideranças de diversas siglas também já se articulam para ampliar o poder de barganha com o governo federal e garantir espaço estratégicos dentro do Congresso.
Como O Globo mostrou neste domingo, o governo já começou a fazer acenos com cargos aos partidos do Centrão que davam suporte a Bolsonaro. O PSDB e o Cidadania, por sua vez, conversam sobre a possibilidade de fusão. Para o cientista político Antonio Lavareda, não há outra saída para manter a governabilidade a não ser investir na divisão do campo da direita, enfraquecendo Lira e o bolsonarismo.
— O Lula precisa estruturar o centro no Congresso e na sociedade. Senão a polarização predomina e o eleitor do centro pode ser aspirado pela extrema-direita.
Para o cientista político Carlos Melo, do Insper, o movimento do governo Lula para atrair partidos de centro é inevitável no xadrez político e deve acirrar a disputa entre o Executivo e o reeleito presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL). Leia abaixo o corpo a corpo com o cientista político:
O que significa esse movimento do governo Lula para atrair partidos de centro diante de um Lira empoderado?
O que estamos vendo é o início de uma disputa política em que o governo vai atacar a base do Lira e tentar arrancar nacos de apoio. Tanto com o PSD, o MDB e o União Brasil, mas também com partidos do Centrão, que havia se aproximado de Bolsonaro. Tem uma parte do PL que não é bolsonarista raiz, assim como do PP. O governo está refém. Se não fizer isso ele é executado.
O senhor se refere a ameaça de impeachment?
O que faz o Lira tão poderoso é o poder de pauta, de colocar ou não os projetos do governo para votar na Casa. E até de pautar um requerimento de impeachment. Lira tem uma liderança que funciona por demanda, que resolve a carência dos deputados. Ele faz esse papel de conseguir recursos junto ao Executivo — o parlamentar não teria acesso não fosse essa intermediação. Ainda assim, o STF tirou do Lira uma ferramenta de coerção como o orçamento secreto. Agora, ele vai ter que negociar e ceder, já que quem libera verba é o governo.
O senhor vê o cenário mais difícil para Lula do que foi para Bolsonaro com Lira?
Eu vejo problemas com o Lira. Haverá provavelmente uma queda de braço. E Lira vai tentar reagir e endurecer como um cara que preside os trabalhos, que tem um poder de pauta na Casa. Mas não acho que é jogo perdido para o governo. A oposição bolsonarista vai ter ali uns 70 deputados. Vão ser instrumentos para pressionar o governo. Mas não vai ter poder de agenda.
E no Senado?
O Centrão tipo Lira no Senado existe em menor proporção. Lá, vejo que a boa vontade do Rodrigo Pacheco com Lula é maior que a do Lira (já que o governo ajudou muito na reeleição). E o governo tem operadores no Senado com capacidade de articulação como Otto Alencar (PSD-BA), Jaques Wagner (PT-BA) e Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que podem ajudar melhor.