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Abin paralela

PF deve concluir inquérito sobre funcionamento "Abin paralela" em abril

Investigação apura de estrutura foi usada no governo Bolsonaro para monitorar adversários

 PF descobriu o uso de outros programas na estrutura, como o Cobalt Strike, que teria sido aplicado para espionar autoridades paraguaias PF descobriu o uso de outros programas na estrutura, como o Cobalt Strike, que teria sido aplicado para espionar autoridades paraguaias - Foto: Antonio Cruz

A Polícia Federal deve concluir ainda neste mês o inquérito que investiga o funcionamento de uma estrutura paralela na Agência Brasileira de Inteligência (Abin) no governo de Jair Bolsonaro para monitorar e atacar adversários da gestão.

Havia uma expectativa de que as apurações fossem finalizadas no fim do ano passado, mas o prazo foi adiado após a descoberta do uso de novas ferramentas espiãs pelos agentes investigados, além do FirstMile.

A utilização do programa secreto foi revelada pelo Globo em março de 2023, o que motivou a abertura do inquérito pela PF no mesmo mês.

Desenvolvido por uma empresa israelense, a ferramenta monitorava a localização de alvos pré-determinados por meio de aparelhos celulares sem autorização judicial.

Segundo as apurações, o FirstMile foi usado para acompanhar os passos de políticos, jornalistas, advogados e adversários de Bolsonaro.

A partir de depoimentos e anotações obtidas em mandados de busca e apreensão, a PF descobriu o uso de outros programas na estrutura, como o Cobalt Strike, que teria sido aplicado para espionar autoridades paraguaias, e o LTE Sniffer, que, segundo o depoimento de um agente, teve o uso avaliado para possíveis ações direcionadas a varreduras em embaixadas.

Procurada para comentar, a Abin não se manifestou.

Em uma oitiva à PF, um agente da Abin relatou que o Cobalt Strike foi usado para invadir computadores de autoridades paraguaias com o intuito de conseguir dados sobre a negociação entre os dois países sobre as tarifas da usina de Itaipu.

O Cobalt Strike é um programa especializado em simular tentativas de invasão a um sistema para testar se as defesas instaladas estão funcionando corretamente.

As declarações do agente à PF foram reveladas pelo portal UOL e confirmadas pelo Globo.

O governo paraguaio chegou a convocar o embaixador do Brasil no país para dar explicações sobre o episódio.

A ação, segundo o agente da Abin, ocorreu com autorização do chefe do órgão no governo de Jair Bolsonaro, mas também teve o aval do atual chefe da agência, Luiz Fernando Corrêa, que assumiu o cargo em 2023.

Em nota, o Itamaraty disse que a ação de inteligência que previa a invasão de computadores de autoridades do Paraguai havia sido autorizada em junho de 2022, no governo Bolsonaro, e suspensa em março de 2023, no início da gestão de Luiz Inácio Lula da Silva.

Já o programa LTE Sniffer funciona, segundo especialistas, como um “IMSI Catcher”, ou seja, com o auxílio de uma antena que permite monitorar o tráfego das redes celulares.

A ferramenta está disponível gratuitamente na internet e tem código aberto. Uma vez instalado e próximo a uma antena, o computador seria capaz de acessar todas as informações sobre as trocas de comunicações entre a torre e os celulares conectados a ela.

De acordo com o agente da Abin ouvido pela PF, a ferramenta era estudada para a construção de um modelo próprio da Abin para rastrear os sinais.

Segundo ele, o objetivo seria o uso em varreduras de representações de países estrangeiros em missões de contramedidas de inteligência.

A investigação do caso da "Abin paralela" tem como um dos alvos principais o ex-diretor da Abin e hoje deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), que também virou réu no caso da trama golpista no Supremo Tribunal Federal. A PF, inclusive, viu conexões entre as duas apurações.

Segundo relatório da PF, uma parte da agência — ou o "núcleo de inteligência paralela — comandada por Ramagem foi "aparelhada" para viabilizar a manutenção de Bolsonaro na cadeira de presidente.

A PF aponta ainda que Ramagem orientou o então presidente a atacar a credibilidade das urnas e adotar uma estratégia mais hostil no enfrentamento contra “o sistema”.

Documentos com esse teor foram encontrados em arquivos de um e-mail de Ramagem captado pelos investigadores.

Em depoimento, Ramagem reconheceu que costumava escrever textos "para comunicação de fatos de possível interesse" de Bolsonaro, mas ressaltou, porém, que não se lembrava se essas mensagens foram passadas adiante. Ele nega qualquer participação na ofensiva golpista e a existência de uma estrutura paralela na Abin.

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