Plataformas admitem ao STF que ataques do Google contra PL das Fake News violaram regras
Empresas dizem que 'brecha' permitiu anúncio impulsionado, que teria sido exibido 13 milhões de vezes e custou R$ 837 mil
As empresas Meta, que administra o Facebook, e Spotify admitiram ao Supremo Tribunal Federal (STF) que os anúncios do Google em suas plataformas contra o projeto de lei (PL) das Fake News violaram as regras de publicidade das empresas. Elas, afirmam, no entanto, que a campanha teria utilizado uma "brecha" nos sistemas. O STF abriu uma investigação após suspeita de "campanha abusiva" das big techs para barrar a votação do texto na Câmara.
Segundo os documentos, as peças do Google atacando a proposta que regula notícias falsas e conteúdos irregulares nas redes foram exibidas pelo menos 13 milhões de vezes nas telas de diferentes usuários e custaram R$ 837 mil, segundo os documentos das empresas.
A representação da Procuradoria-Geral da República (PGR) que embasou a abertura do inquérito afirma que, ao promover um movimento orquestrado contra o projeto de lei, as plataformas podem ter cometido crimes contra as instituições democráticas, contra a ordem consumerista e contra a economia e as relações de consumo.
Segundo documentos das empresas, o gasto do Google com os anúncios contra o PL das Fake News apenas no Facebook foi de R$ 639 mil. No Spotify, o valor seria semelhante, mas a propaganda foi retirada após um dia, quando a empresa também identificou que ele contrariava as suas regras internas. A peça começou a ser veiculada no dia 29 de abril e foi interrompida no dia 1 de maio.
O impulsionamento desses anúncios já havia sido mapeado pelo NetLab, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Um relatório do grupo apontou que usuários que pesquisavam sobre o tema eram direcionados a conteúdos com ataques ao texto em discussão na Câmara. “Mesmo após a Meta ter recategorizado o anúncio do Google e, consequentemente, interrompido sua veiculação e publicizado suas informações de transparência, o Google voltou a veicular o mesmo anúncio sem a sinalização correta”, diz o levantamento.
" Isso mostra como a regulamentação funciona. Quando se tem um chamado para cumprir a regra, ela foi cumprida. Mas é importante citar que na biblioteca de transparência do Google, eles próprios não constam como anunciantes e também fizeram anúncios no seu mecanismo de busca. E deveria estar lá porque é um anúncio político. Ou seja, ainda não cumpriram a transparência dentro de casa", afirma a professora da UFRJ, Marie Santini, pesquisadora do NetLab.
Sob pressão das plataformas, alguns deputados decidiram adiar a análise do projeto, mesmo após a maioria dos parlamentares terem aprovado o caráter de urgência para a votação da proposta. O presidente da Câmara, Arthur Lira, enviou uma denúncia à Procuradoria-Geral da República (PGR) que apontou "contundente e abusiva ação" das plataformas contra o PL das Fake News. A representação do parlamentar motivou a abertura de um inquérito no STF, sob a relatoria do ministro Alexandre de Moraes.
Ao analisar o caso, o magistrado alertou que as redes sociais "não são terra sem lei" e devem se submeter à legislação brasileira. Para o ministro, é "urgente, razoável e necessária a definição – legislativa e/ou judicial – dos termos e limites da responsabilidade solidária civil e administrativa das empresas; bem como de eventual responsabilidade penal dos responsáveis por sua administração". Moraes determinou que o Google e outras plataformas retirassem do ar as propagandas com ataques ao projeto das fake news.
Entre os principais pontos da proposta, estão a responsabilização das plataformas por conteúdo ilegal disseminado em seus meios e a determinação de que relatórios de transparência sejam divulgados semestralmente. O texto também estabelece o "dever de cuidado", que determina que as big techs, antes mesmo de serem notificadas, fiscalizem o material veiculado em suas redes.
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Reação das empresas
O Spotify, plataforma de áudios e vídeos, afirmou ao STF que está investigando internamente os motivos que levaram à veiculação da propaganda contrária a um projeto de lei em discussão na Câmara, apesar de a empresa ter como regra não aceitar anúncios políticos. Já a Meta, dona do Facebook, afirmou que, após a decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo, para excluir conteúdo impulsionado com ataques ao projeto, recategorizou os anúncios inseridos sem rótulo pelo Google, mesmo aqueles inativos, pausados ou já retirados pela empresa.
Nas redes sociais da Meta, que também controla o Instagram, os anunciantes são obrigados a declarar quando a propaganda é considerada de interesse social ou político. Nesse caso, por motivos de transparência, a empresa precisa dar publicidade a uma série de informações aos seus usuários como, por exemplo, o investimento feito e o número de vezes em que a propaganda foi exibida.
O Google afirmou ao STF que, antes mesmo da decisão de Moraes, suspendeu todos os anúncios de conteúdos relacionados ao projeto de lei, seja em suas próprias plataformas ou de terceiros. A empresa também disse que “não há fundamento legal ou constitucional para proibir a compra e uso de anúncios para a divulgação de conteúdos lícitos relacionados a tema de interesse geral, sejam de elogio ou crítica”.
Procurada pelo Globo, a companhia afirmou que não irá comentar o assunto, porque o processo corre sob sigilo. A Meta também preferiu não comentar.