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Porte de maconha, aborto, CPI da Covid: relembre decisões de Barroso, novo presidente do STF

Ministro, que defende papel "iluminista" da Corte, também atuou como advogado em casos emblemáticos no Supremo, como reconhecimento da união homoafetiva

Luís Roberto Barroso, novo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF)Luís Roberto Barroso, novo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) - Foto: Roberto Jayme/Ascom/TSE

Novo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), após a aposentadoria da ministra Rosa Weber, o ministro Luís Roberto Barroso tem um histórico de decisões emblemáticas em casos controversos ou de grande apelo na Corte.

Barroso chegou ao Supremo em 2013, indicado pela então presidente Dilma Rousseff, e já com uma trajetória de participações emblemáticas na Corte como advogado. Na última década, como ministro, foram dele votos condutores de julgamentos envolvendo temas como a descriminalização do aborto, a restrição do foro privilegiado e a instauração de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar a atuação do governo Bolsonaro na pandemia da Covid-19.

Outro posicionamento do ministro que chamou atenção em sua trajetória no Supremo foi em julgamento de recurso extraordinário, em 2015, no qual propôs parâmetros para descriminalizar o porte de maconha. O caso foi retomado neste ano pelo STF.

Relembre a seguir alguns dos principais temas capitaneados por Barroso na Corte:

Porte de maconha
Em 2015, após votos dos ministros Gilmar Mendes e Edson Fachin pela descriminalização do consumo de maconha para consumo próprio, Barroso avançou no tema propondo a fixação de quantidades de referência para diferenciar usuários de traficantes. À época, o ministro propôs o porte de até 25 gramas ou o plantio de até seis plantas fêmeas da espécie como parâmetro para configurar uso pessoal, o que deveria, em seu entendimento, ficar fora de tipificação penal.

Barroso justificou a posição citando legislações de outros países, como Uruguai e Espanha, que estabeleceram quantidades máximas ao descriminalizarem o porte de maconha.

O voto de Barroso chamou atenção porque Gilmar e Fachin, em seus votos, haviam apenas apontado a inconstitucionalidade do artigo da lei que criminaliza o uso pessoal de drogas com relação à maconha, sem avançar em critérios.

Neste ano, na retomada do julgamento, Barroso chegou a propor uma revisão do próprio voto para elevar a 100 gramas a quantidade de referência para diferenciar usuário e traficante. O Supremo formou maioria para estabelecer uma quantidade mínima para configurar tráfico, mas ainda não concluiu o julgamento.

Descriminalização do aborto
Em 2016, a Primeira Turma do STF analisou um pedido de habeas corpus contra a prisão preventiva de dois presos que atuavam numa clínica clandestina de aborto no Rio. O julgamento, embora tenha se limitado à análise do caso específico, foi considerado um marco jurídico para a descriminalização do aborto, tema que está na pauta do Supremo neste ano.

Responsável pelo voto-vista naquele processo, depois acompanhado pela maioria dos colegas, Barroso baseou seu parecer contra a prisão preventiva dos acusados no entendimento de que a criminalização do aborto realizado até o terceiro mês de gravidez era uma violação aos direitos fundamentais a mulher.

No voto, Barroso argumentou que o enquadramento criminal do aborto nessas circunstâncias "impede que estas mulheres recorram ao sistema público de saúde para se submeterem aos procedimentos cabíveis". O ministro também frisou que sua decisão não era um estímulo ao aborto, "pelo contrário, o que se pretende é que ele seja raro e seguro”.

Restrição ao foro privilegiado
Em 2018, Barroso propôs questão de ordem para levar ao plenário do STF a discussão, no âmbito de uma ação penal da qual era relator, sobre a restrição do foro privilegiado. O ministro propôs a tese, acolhida pela maioria dos colegas, de que o foro por prerrogativa de função para deputados federais e senadores só se aplica a crimes relacionados ao exercício do mandato.

No seu voto, Barroso estipulou que os processos deveriam descer a primeira instância ao fim do mandato, salvo em casos que já estivessem em fase de alegações finais, prontos para entrar em julgamento.

Segundo o Supremo, a decisão levou a uma redução de quase 80% do acervo de inquéritos e ações penais da Corte até o ano passado, já que diversos casos de políticos sem mandato passaram a tribunais locais. O número voltou a subir neste ano com as ações penais derivadas dos atos golpistas de 8 de janeiro.

À época da decisão sobre a restrição de foro, Barroso argumentou que o "congestionamento" do Supremo com inquéritos e ações penais de políticos e as frequentes alterações de cargos eletivos, o que submetia os processos a constantes mudanças de tribunal, representava uma disfuncionalidade que aumentava o risco de prescrição dos casos.

CPI da Covid
Uma liminar de Barroso em 2021, posteriormente referendada pelo plenário do Supremo, obrigou a presidência do Senado a instaurar a CPI da Covid, para investigar omissões do governo Bolsonaro no combate à pandemia. O requerimento de instauração da CPI, apresentado pela oposição ao então presidente, havia atingido o número exigido de assinaturas de senadores e cumpria, na avaliação feita por Barroso, os requisitos regimentais de ter fato determinado e prazo de duração.

"Trata-se de garantia que decorre da cláusula do Estado Democrático de Direito e que viabiliza às minorias parlamentares o exercício da oposição democrática. (...) Por esse motivo, a sua efetividade não pode estar condicionada à vontade parlamentar predominante", escreveu Barroso na ocasião.

Na pandemia, Barroso também foi relator de uma ação proposta pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e por partidos políticos na qual determinou que o governo Bolsonaro apresentasse e implementasse um plano de mitigação do contágio pela Covid-19 entre povos indígenas.

Contribuição para sindicatos
Barroso propôs neste ano uma mudança no entendimento adotado pelo próprio Supremo, em 2017, sobre o recolhimento da contribuição assistencial de trabalhadores para os sindicatos. A tese do ministro, acompanhada pelo plenário da Corte, retomou o pagamento da contribuição em casos de negociação ou acordo coletivo, embora abrindo a possibilidade de que empregados se manifestem individualmente contra o pagamento.

Diferentemente do imposto sindical, pagamento que equivalia ao salário de um dia de trabalho e que foi extinto pelo Congresso na reforma trabalhista de 2017, a contribuição assistencial é definida em assembleia para custear atividades do sindicato.

Ao reverter o entendimento anterior da Corte, que havia tirado a obrigatoriedade da contribuição definida em assembleia, Barroso argumentou que o fim do imposto sindical criou um novo cenário que permitiu a retomada da contribuição assistencial, em novas bases.

Histórico pré-Supremo e princípio "iluminista"
Antes de chegar ao Supremo, Barroso se notabilizou como jurista com atuação voltada para o Direito Constitucional, com participação em casos de grande repercussão. Ele foi o autor de uma ação, julgada pelo STF em 2011, que reconheceu a união homoafetiva, equiparando o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo à união entre homens e mulheres.

Barroso também atuou em processos como o que autorizou pesquisas com células-tronco embrionárias e na rejeição do pedido de extradição do militante italiano Cesare Battisti. No primeiro caso, em 2008, a Corte decidiu, por seis votos a cinco, pela constitucionalidade do trecho da Lei de Biossegurança que previa esse tipo de pesquisa. No segundo caso, em 2009, o Supremo deliberou que a decisão final sobre a extradição caberia ao presidente da República -- à época, Lula recusou extraditar Battisti, em entendimento depois revertido por Bolsonaro.

Em artigos e palestras, tanto antes como após ter sido nomeado ministro do Supremo, Barroso costuma argumentar que tribunais constitucionais têm o papel de promover avanços sociais, mesmo sem a concordância da maioria da sociedade naquele momento. Um exemplo desta função "iluminista", como é classificada por Barroso, seria o julgamento das uniões homoafetivas em 2011, na avaliação do ministro.

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