Brasil

Prefeito de Porto Alegre muda de branco para pardo na eleição e justifica: "Correção histórica"

Quase 40 mil candidatos mudaram declaração de cor e raça em quatro anos, o que influi em destinação de recursos; TSE estipulou regras na tentativa de coibir burla

O prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB), com microfone em mãos: mudança de branco para pardo na eleição de 2024 O prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB), com microfone em mãos: mudança de branco para pardo na eleição de 2024  - Foto: Reprodução/Facebook

Cerca de 40 mil candidatos alteraram a autodeclaração de cor ou raça nas eleições deste ano, em comparação com a última disputa municipal.

A maioria dos casos envolve candidatos que modificaram a declaração anterior para se registrar agora como pretos ou pardos.

O prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB), que busca a reeleição, foi um dos que alterou sua declaração de branco, em 2020, para pardo neste ano.

Questionada pelo Globo, a campanha afirmou, em nota, que o “o MDB de Porto Alegre fez uma correção histórica em relação à cor” de Melo. A autodeclaração de cor e raça se tornou obrigatória a partir das eleições de 2014.

 

Melo, que é filiado ao MDB desde a década de 1980, já se elegeu a três mandatos como vereador em Porto Alegre e foi vice-prefeito da capital gaúcha entre 2013 e 2016. Depois, foi deputado estadual, e deixou o cargo quando se elegeu à prefeitura em 2020. Neste ano, ele concorre à reeleição apoiado por seis partidos, incluindo o PL, sigla do ex-presidente Jair Bolsonaro.

A eleição em Porto Alegre vem sendo pautada até aqui pelo impacto das chuvas que assolaram o Rio Grande do Sul, e particularmente a capital gaúcha, no início deste ano.

Nas eleições de 2022, houve controvérsias envolvendo mudanças na autodeclaração de cor e raça por parte de candidatos a cargos majoritários. O ex-prefeito de Salvador ACM Neto (União), que concorreu ao governo da Bahia, chegou a se cadastrar como branco, mas depois pediu a alteração para pardo e foi alvo de críticas.

Outro caso, este também no Rio Grande do Sul, envolveu o então vice-presidente Hamilton Mourão (Republicanos-RS), que se elegeu ao Senado em 2022. Mourão se declarou como branco, diferentemente do que havia feito em 2018, quando se registrou como indígena ao concorrer como colega de chapa de Bolsonaro. Ele alegou à época que houve um "erro de preenchimento" no formulário de 2022, e que se considera indígena "com muito orgulho".

A situação inversa ocorre neste ano com os dois principais concorrentes à prefeitura de Salvador: o atual prefeito, Bruno Reis (União Brasil), e o vice-governador da Bahia, Geraldo Júnior (MDB), que antes haviam se declarado como pardos, agora se registraram como brancos. Em nota, Reis afirma que fez isso “para não restar qualquer tipo de dúvidas” de que não deseja ter acesso a recursos de candidatos negros. Também em nota, Geraldo disse que sempre foi “reconhecido pela sociedade como um homem branco”.

A legislação obriga às legendas a repassarem no mínimo 30% da verba dos fundos eleitoral e partidário a candidaturas negras. O percentual foi fixado por uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) aprovada pelo Congresso na última quinta-feira. A PEC também anistiou multas a partidos que descumpriram a cota em 2022, quando os repasses tinham que ser proporcionais ao número de candidatos.

Em fevereiro, o TSE determinou que, caso um candidato mude sua declaração para preto ou pardo, ele seja intimado para confirmar a alteração. Caso haja a admissão de erro, ou não haja manifestação, ele não poderá receber os recursos destinados a candidatos pretos e pardos.

Apesar deste esforço, a prática já ocorreu em 26,2 mil candidaturas, sendo que 19,9 mil candidatos passaram a se declarar como pardos e 6,3 mil como pretos.

Houve ainda 10,9 mil postulantes que mudaram seu registro para branco, e outras 250 trocas para indígena, totalizando cerca de 38 mil alterações de cor ou raça neste ano. O percentual corresponde a aproximadamente 8% do total de candidatos. Em 2020, houve 43,1 mil mudanças ao todo, na comparação com a eleição anterior.

Parte dos candidatos alegam que a troca ocorre por ter havido erro na eleição anterior. É o caso do prefeito de São José Do Divino (MG), Geka (Republicanos), que afirma sempre ter se considerado negro.

— Se foi declarado branco (na outra eleição), está errado. Sou de família preta. Minha cor é negra mesma — afirma.

A mudança de branco para preto também ocorreu com o prefeito de Nova Venécia (ES), André Fagundes (Podemos). A campanha alegou que ele, na verdade, queria se declarar pardo, e já pediu a alteração. Segundo sua assessoria, ele “se considera pardo em razão da sua história e do seu histórico familiar de pessoas negras”.

O prefeito de Santo Antônio do Jardim (SP). Neguinho (Podemos), também mudou a declaração neste ano, mas já pediu correção. Segundo petição de seu advogado, Valter Domingues, houve um erro devido ao apelido utilizado pelo candidato, o que fez o registro de cor constar “erroneamente (como) preto, quando o correto é branco”.

Outra alegação de erro no preenchimento do registro partiu do vereador Karlyson Rebolça, do PL de Macapá:

— Então foi o partido que errou. Não estou sabendo disso. Eu sou branco, é só ver minha foto — afirmou.

Parte dos candidatos também passaram a se declarar como indígenas. Foi o que aconteceu com o vereador Osvaldo Maturano (PRD), de Vila Velha (ES), que há quatro anos registrou-se como branco. Ele explica que conheceu melhor sua família e descobriu que seu tataravô era indígena, do povo puri.

Já a candidata a vereadora Liliane Melo (PT), de Montenegro (RS), afirmou que houve um erro na troca de seu registro, de branca para indígena.

— Não sou indígena. Eu tenho um grau de parentesco, mas não tenho como comprovar. Vou pedir para alterar.

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