Prefeito de SP, Ricardo Nunes mira a direita e o bolsonarismo para cavar espaço na disputa de 2024
Prefeito de SP quer evitar fracasso como o de Rodrigo Garcia, candidato que se apresenta como de centro, mas é esmagado pela polarização
A possibilidade de Ricardo Salles (PL) disputar a prefeitura de São Paulo, como já defendido pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, traz à tona um risco ao prefeito paulistano, Ricardo Nunes (MDB): tornar-se uma espécie de “Rodrigo Garcia” na eleição do ano que vem — o candidato de centro que acaba espremido pela polarização, representada na esquerda pelo deputado federal Guilherme Boulos (PSOL).
Diante dessa possibilidade, o emedebista tem estreitado desde já a sua relação com partidos de direita — como PL, Republicanos e PP — e flertado com bolsonaristas que não querem apoiar Salles.
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A primeira grande mudança deve ocorrer no marketing, com a troca de Felipe Soutello, então conselheiro de Nunes, por Duda Lima, marqueteiro que trabalhou na campanha de Bolsonaro. Embora não tenha ainda um contrato fechado com o prefeito, Duda já começou a estudar estratégias para a reeleição do emedebista. No fim de fevereiro, em jantar com lideranças de sete partidos, ele apresentou os resultados de uma pesquisa quantitativa contratada pelo MDB para mapear o atual cenário eleitoral.
Além de ajudar a conquistar o eleitor que votou em Bolsonaro no ano passado, a vinda de Duda é estratégica para aproximar o prefeito paulistano do presidente do PL, Valdemar Costa Neto, de quem o marqueteiro é “homem de confiança”. Isso porque o PL é visto como uma peça-chave na campanha: se estiver ao lado do prefeito, enterra a candidatura de Salles e dá ao emedebista o maior tempo de televisão da corrida eleitoral. Caso o PL aposte mesmo no ex-ministro do Meio Ambiente, a eleição municipal pode repetir a polarização do pleito estadual entre Fernando Haddad (PT) e Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Centro-direita
Uma das principais figuras do bolsonarismo que orbitam a pré-campanha do prefeito é Fabio Wajngarten. O ex-chefe da Secretaria Especial de Comunicação Social (Secom) do governo Bolsonaro articula nos bastidores para que a direita não se “aventure” em uma candidatura própria. A expectativa do ex-secretário, segundo interlocutores, é trabalhar ao lado de Duda na candidatura de Nunes, repetindo a dobradinha que fizeram na campanha de Bolsonaro.
A pessoas próximas, Wajngarten afirma que não irá permitir “movimentos egoístas” da direita que resultem na fragmentação em vários candidatos — cenário que ele considera favorável a Boulos.
Segundo aliados do ex-chefe da Secom, Wajngarten acredita que o prefeito tem mais condições de derrotar o candidato do PSOL do que Salles. Mas, para isso, precisaria deslocar a sua candidatura para a centro-direita e trazer para a chapa os principais partidos do campo, em especial o PL, com a oferta da vaga da vice, indicações a secretarias e adesão às pautas ideológicas. Nunes, no entanto, só se mostra disposto a atender ao primeiro pedido.
Uma possível adesão de Wajngarten à candidatura de Nunes preocupa o entorno de Salles, uma vez que o ex-secretário é próximo de Bolsonaro.
No mês passado, o prefeito paulistano se encontrou com o deputado Eduardo Bolsonaro (PL), filho do ex-presidente, e a secretária Sonaira Fernandes, que comanda a pasta da Mulher no governo Tarcísio. No encontro, que foi motivo de incômodo ao ex-ministro do Meio Ambiente, Nunes disse que não é “inimigo” do bolsonarismo e quer caminhar ao lado do campo no ano que vem.
Bolsonaristas se queixam da falta de acenos concretos de Nunes à direita mais radical, como a sugestão ou aprovação de pautas ideológicas em sua gestão. A interlocutores, porém, o prefeito diz que não precisará fazer acenos, pois o apoio do PL virá “naturalmente”.
Hoje, o principal aliado de Nunes no PL municipal é o vereador Isac Félix, que preside a legenda em São Paulo. Ao GLOBO, Félix disse que o PL-SP está “100% com Nunes” e negou a possibilidade de apoiar Salles. Segundo ele, a interlocução de Nunes com o eleitorado conservador pode ocorrer por meio da aproximação com os evangélicos.
— Toda eleição passa pela igreja. E o prefeito tem feito essa interlocução. A bancada (católica e evangélica) tem levado ele às principais lideranças — disse Félix, que é pastor e também tem atuado na aproximação de Nunes com as igrejas batistas.
No fim do mês passado, o emedebista ainda somou ao seu time José Trabulo Junior, ex-diretor da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) no governo Bolsonaro. Trabulo fez campanha para o ex-presidente e é aliado de longa data de Ciro Nogueira, ex-chefe da Casa Civil e presidente nacional do PP, outra força que o prefeito paulistano quer atrair para seu arco de alianças em 2024. Na segunda, em entrevista ao Roda Viva, Nogueira saiu em defesa do prefeito:
— Vou lutar para que o presidente Bolsonaro apoie o melhor candidato. (...) Vou defender que a gente dê a chance para esse grande prefeito, que está fazendo um grande trabalho — disse Nogueira, se referindo a Ricardo Nunes.
Apesar do movimento, Nunes deve enfrentar obstáculos para arrebatar o eleitorado à direita. A começar pelo principal líder do campo, Bolsonaro. Quando tocam no assunto das eleições municipais de 2024, auxiliares têm lembrado o ex-presidente que o prefeito de São Paulo não o apoiou no segundo turno da última eleição presidencial — o que joga uma pá de cal na possibilidade de um apoio “oficial” do bolsonarismo, ainda que a candidatura de Salles não decole.
Na última terça-feira, Salles foi a Brasília para se encontrar com Bolsonaro, na sede do PL, e discutir as eleições municipais. Ele aposta no ex-presidente para tentar convencer Valdemar Costa Neto a apoiar sua empreitada. Após a eleição de 2022, quando a sigla passou por uma hipertrofia e conquistou a maior bancada na Câmara dos Deputados, se fortaleceu entre os deputados e dirigentes do entorno de Valdemar a ideia de que o partido hoje é grande demais para não lançar candidaturas próprias nas principais capitais.
Apoiadores de Bolsonaro na Câmara Municipal paulistana também não veem surtirem efeito os acenos de Nunes ao grupo. Eles citam a ausência de representantes do bolsonarismo no primeiro escalão da prefeitura e a falta de apoio a projetos conservadores no Legislativo.