Projetos pró-aborto e maconha contra orientação do CNS são assinados por deputados da base de Lula
Resolução do Conselho Nacional de Saúde gerou revolta entre parlamentares, resultando em oito iniciativas contrárias ao texto na Câmara, que ganharam adesão de membros de União Brasil, PSD e MDB
A resolução de número 715 do Conselho Nacional de Saúde (CNS) gerou reações contrárias até mesmo entre deputados da base do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Desde que o órgão colegiado vinculado ao Sistema de Saúde Único (SUS) emitiu orientações a favor da legalização do aborto e da maconha, oito Projetos de Decreto Legislativo (PDL) foram protocolados buscando suspender os efeitos do texto.
A medida, no entanto, não possui efeitos práticos, já que seu caráter é apenas de aconselhamento — o governo, portanto, não tem obrigação legal de cumprir a resolução.
Apesar disso, por ter sido feita por um conselho associado ao Ministério da Saúde e ter em sua estrutura seis conselheiros vinculados à pasta, como a própria ministra Nísia Trindade, o episódio não agradou os parlamentares.
Leia também
• O discurso não lido: governo preparou fala para Bolsonaro admitir derrota, mostram e-mails
• "Não vejo maldade em cotar", diz Bolsonaro sobre Cid ter negociado Rolex recebido em viagem oficial
• Lula sanciona lei que autoriza ozonioterapia; entenda o que muda
Entre os deputados que se manifestaram em via legislativa, há 17 filiados a partidos da base do governo: MDB, PSD e União Brasil, que, juntos, lideram oito ministérios.
No caso do MDB, Renan Filho (Transportes), Simone Tebet (Planejamento) e Jader Filho (Cidades) chefiam pastas. Já o PSD tem três ministérios, comandados por Carlos Fávaro (Agricultura), André de Paula (Pesca) e Alexandre Silveira (Minas e Energia). Por sua vez, o MDB tem Celso Sabino (Turismo) e Juscelino Filho (Comunicações) no primeiro escalão da Esplanada.
Participaram do movimento contrário à resolução os deputados Nicoletti (União-RR), Cristiane Lopes (União-RO), Pezenti (MDB-SC), Coronel Assis (União-MT), Reinhold Stephanes (PSD-PR), Padovani (União-PR), Sargento Fahur (PSD-PR), Rodrigo Valadares (União-SE), Alfredo Gaspar (União-AL), Rosângela Moro (União-SP), Mendonça Filho (União-PE), Ismael (PSD-SC), Cezinha de Madureira (PSD-SP), David Soares (União-SP), Marcos Soares (União-RJ), Pastor Diniz (União-RR) e Dayany Bittencourt (União-CE).
O PDL de maior adesão foi protocolado pela bolsonarista Chris Tonietto (PL-RJ). No total, 52 parlamentares assinaram a proposta, sendo dez da base. Os outros sete chancelaram textos de autoria própria ou participaram da movimentação da bancada evangélica, sob o comando de Silas Câmara (Republicanos-AM) e Cezinha de Madureira.
Entenda a resolução
O CNS aprovou a resolução no último 20, elencando 59 orientações para que o Ministério da Saúde formule o Plano Plurianual (PPA) e o Plano Nacional de Saúde (PNS). No entanto, quatro pontos incomodaram os parlamentares.
O documento formulado a partir de videoconferências entre os conselheiros trouxe como sugestão ao governo a promoção de campanha educativa para os funcionários do SUS sobre a política LGBTQIA+ e o reconhecimento das manifestações das religiões de matriz africana como equipamento promotor de saúde.
Uma das orientações de maior repercussão foi a 44, que dispõe sobre a identidade de gênero: "Revisão da cartilha de pessoas trans, caderneta de gestante, pré-natal, com foco não binário; com a garantia de acesso e acompanhamento da hormonioterapia em populações de pessoas travestis e transgêneras, pesquisas, atualização dos protocolos e redução da idade de início de hormonização para 14 anos", diz o trecho. O documento também sugere a legalização do aborto e da maconha no Brasil.
O que é o CNS?
O Conselho Nacional de Saúde (CNS) é uma instância colegiada, deliberativa e permanente do SUS, integrante da estrutura organizacional do Ministério da Saúde. De acordo com a legislação, o órgão tem como função fiscalizar, acompanhar e monitorar as políticas públicas de saúde nas suas mais diferentes áreas, levando as demandas da população ao poder público.
O conselho atua na formulação de estratégias e no controle da execução da política de saúde na instância correspondente, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros. As orientações fornecidas ao Executivo não são de obrigatoriedade legal e cabem ao presidente homologá-las, caso deseje.
“O Plano de Saúde deverá considerar as diretrizes definidas pelos Conselhos e Conferências de Saúde e que ele deve ser submetido à apreciação e aprovação do Conselho de Saúde respectivo”, diz trecho da portaria regulamentadora.
O órgão é formado por 48 conselheiros titulares, entre representantes do governo, prestadores de serviço, profissionais de saúde e usuários. Atualmente, conta com seis funcionários do Ministério da Saúde, entre eles a ministra Nisia Trindade.
O que diz o Ministério da Saúde?
Procurado pelo Globo, o Ministério da Saúde reiterou o caráter sugestivo do CNS:
O Ministério da Saúde informa que cumpre a legislação e a Constituição sobre os temas citados e que a atual gestão não tem projetos de alteração das normas em vigor.