Quatro manifestantes acampados no QG relatam orientação para deixar local antes das prisões
Em depoimento, eles disseram que bateram em retirada na madrugada do dia 9 de janeiro; naquela mesma hora, blindados do Exército impediam a entrada da Polícia Militar-DF para deter os golpistas
Quatro participantes dos atos golpistas de 8 de janeiro relataram em depoimento à Polícia Civil de Minas Gerais que foram orientados por um "pessoal do Exército" a deixar o acampamento em frente ao Quartel General do Exército, em Brasília, horas antes de uma operação realizada pela Polícia Militar, com o apoio das Forças Armadas, que prendeu suspeitos de terem invadido as sedes dos Três Poderes no dia anterior.
Eles contaram que a "orientação" foi dada às 2 horas da madrugada do dia 9 de janeiro. Àquela altura autoridades do governo federal e comandantes do Exército discutiam as diretrizes da ação que ocorreria na manhã seguinte, seguindo a determinação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.
Depois das invasões aos prédios públicos, as forças de segurança chegaram a planejar uma ação de retirada dos manifestantes do acampamento à noite. Na ocasião, porém, os militares posicionaram dois blindados em frente à rua do QG e bloquearam o acesso de uma tropa da PM, que se preparava para realizar as prisões por ordem do então interventor federal, Ricardo Cappelli. Com o consentimento do governo Lula, a operação foi adiada para a manhã do dia 9.
Nesse intervalo, durante a madrugada, diversos suspeitos conseguiram escapar do local antes da chegada da PM, inclusive, os quatro depoentes. Eles relataram que, assim que receberam o aviso do "pessoal do Exército", chamaram um carro de aplicativo e foram a Luziânia (GO), onde estava o ônibus que os havia levado do Guarujá (SP) a Brasília.
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Outras 1.500 pessoas que permaneceram no acampamento acabaram sendo presas e encaminhadas à Academia Nacional da Polícia Federal no dia 9. Elas respondem hoje pelos crimes de atos terroristas, golpe de Estado, associação criminosa, ameaça, entre outros.
Os depoimentos constam em um processo ao qual O GLOBO teve acesso. Os quatro homens acabaram sendo interceptados na rodovia BR-040 na altura de Paracatu, no interior de Minas Gerais. A Polícia Rodoviária Federal (PRF) acabou encaminhando-os para a Polícia Civil de Minas, que os fichou, prendeu e colheu os depoimentos.
Ao fazer a varredura no ônibus, os policiais encontraram um cartão de estacionamento do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), três cápsulas de granadas de gás já deflagradas, três cartuchos de bala de borracha, um soco inglês, três rádios comunicadores e um panfleto com os dizeres "SOS FFAA INELEGIBILIDADE".
Os quatro homens confirmaram que compareceram aos atos, mas negaram que participaram da depredação nos prédios públicos. O construtor José de Oliveira admitiu que subiu a rampa do Planalto e chegou a tentar "conter os radicais". No fim, diz ele, acabou saindo do Planalto "em fila indiana" escoltado pela PM-DF. Depois, foi liberado e logo regressou ao acampamento na frente do quartel.
Outro que também subiu a rampa do Planalto foi o bombeiro aposentado Fernando Portella. Depois, ele disse que "foi dar uma olhada no prédio do STF que já estava todo detonado". Quando percebeu o "quebra quebra", teria se retirado para o QG.
"Que ao sair com seu grupo da praça dos Três Poderes retornaram para o QG; Que na madrugada de hoje [dia 9], por volta das 2h foram orientados por pessoas do Exército a deixarem o local; que prontamente o declarante e o seu grupo pegaram um carro de aplicativo e foram para a cidade onde ônibus estava", diz a transição do depoimento de Portella. A mesma versão se repetiu na oitiva de Oliveira e outros dois manifestantes.
Procurados, o Ministério da Defesa e o Exército ainda não se pronunciaram.