Queiroz abandona discrição e chama Bolsonaro de "comandante" em busca de eleição na Câmara
Após anulação do caso da 'rachadinha', ex-assessor de Flávio Bolsonaro se filia ao PTB para concorrer a deputado federal e garante alinhamento ao bolsonarismo, mesmo sem contato com presidente
Personagem central do caso das “rachadinhas”, primeira investigação que respingou no governo Bolsonaro, o ex-assessor Fabrício Queiroz trocou o silêncio e a discrição adotados quando foi alvo do Ministério Público (MP-RJ) pelos holofotes de quem busca uma candidatura a deputado federal.
Queiroz, aos 56 anos, subtenente reformado da Polícia Militar do Rio, forjou para si mesmo uma nova patente: a de soldado a serviço do “comandante”, forma como se refere ao presidente Jair Bolsonaro, de quem não espera receber apoio explícito nesta eleição.
Em entrevista ao Globo, Queiroz, que se filiou ao PTB para disputar uma vaga na Câmara dos Deputados, desencoraja os que esperam algum tipo de desalinhamento com o presidente mesmo com a negativa de fazer campanha ao lado da família Bolsonaro.
Trata-se de uma situação distinta à que viveu em eleições anteriores, inclusive na de 2018, que elegeu o senador Flávio Bolsonaro antes das “rachadinhas” virem à tona. Amigo da família, além de assessor parlamentar, Queiroz sempre participou ativamente das campanhas de Bolsonaro e de Flávio.
— Meus inimigos são os bandidos que combati em 30 anos de carreira da Polícia Militar do Rio. Eu sempre fui um policial de linha de frente, combatente – declara Queiroz, que também serviu por quatro anos ao Exército, onde conheceu Bolsonaro.
Queiroz foi apontado pelo MP como operador do desvio de salários de outros assessores no gabinete de Flávio, mas a investigação foi posteriormente anulada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Hoje, livre do peso do caso, Queiroz transita com tranquilidade por reuniões políticas e encontros com amigos, sempre registrados em suas redes sociais. Nelas, também publica críticas, normalmente jocosas e com termos chulos, a adversários de Bolsonaro, como o ex-presidente Lula (PT) e o ex-juiz Sergio Moro (União). O único tema em que mantém silêncio é rachadinha.
— Não tenho o que falar. Aquele problema foi meu, apenas. De mim, não passa. Fiquei calado esse tempo todo, embora perseguido por jornalistas o tempo todo – afirma.
O ponto de partida do caso das rachadinhas foi um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) que detectou movimentação atípica de R$ 1,2 milhão nas contas de Queiroz. À época, o ex-assessor de Flávio argumentou que fazia “rolos” com venda de carros. Hoje, projeta uma campanha “sem um tostão” para se eleger deputado.
Queiroz se filiou ao PTB, sigla que terá cerca de R$ 113 milhões à disposição do fundo eleitoral. Não chega ao patamar do PL, sigla de Bolsonaro, que terá cerca de R$ 285 milhões, e onde Queiroz teve as portas fechadas – sua filiação, em suas palavras, deixaria “o comandante de saia curta”.
— O comandante disse que só voltará a falar comigo depois que ficar esclarecido o problema das rachadinhas. Sou um soldado. Obedeço. A gente não se fala, mas se respeita — afirma Queiroz, que diz buscar os votos dos eleitores “bolsonaros-raiz”.
Em fevereiro, ao Globo, Flávio Bolsonaro disse ter se encontrado com Queiroz no fim de 2021, em Brasília, e dito para o ex-assessor “ir à luta” com sua candidatura. Também sugeriu que ele concorresse a deputado estadual. Queiroz agradeceu o aval, mas pensa diferente: “Minhas bandeiras estão no Congresso Nacional”.
No PTB, o “soldado” Queiroz já prestou continência, literalmente, para um totem do ex-presidente da sigla, Roberto Jefferson, levado a uma manifestação bolsonarista em setembro. Queiroz diz que o PTB atual, envolto em brigas internas após o afastamento de Jefferson, “é o partido mais à direita” que conhece, e que o ex-deputado condenado pelo mensalão “teve de pagar um preço” pela “coragem de denunciar” o esquema de corrupção do qual participava.
Outro que Queiroz mantém em alta estima é o ex-policial Adriano Magalhães da Nóbrega, com quem atuou na PM do Rio, e que se tornou posteriormente chefe do grupo de extermínio Escritório do Crime.
— Adriano, não. Capitão Adriano – corrige Queiroz.
Quando Adriano foi morto em operação policial na Bahia, em fevereiro de 2020, Queiroz mantinha-se recluso em meio ao caso da rachadinha, alternando, segundo o MP, períodos no Rio com idas a Atibaia (SP), onde se abrigava no escritório do advogado Frederick Wassef.
Queiroz lamenta as circunstâncias da morte do amigo e lembra que, em 2003, ambos foram homenageados pelo então deputado Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). Em 2005, por orientação do pai, Flávio concedeu a medalha Tiradentes a Adriano, à época preso pela morte de um guardador de carros.
— (Adriano) Foi um dos melhores e mais corajosos policiais que conheci. Não tinha condenação alguma, até ser injustamente acusado por auto de resistência contra um cara que, na época, disseram que era flanelinha. Jair deu uma medalha para o Adriano. Depois, o que ele fez na vida foi problema dele. (Colaborou Bernardo Mello)