Sob resistências, Bolsonaro pretende indicar ministro para o Tribunal de Contas
A escolha de alguém de confiança ocorre no momento em que Bolsonaro, que já anunciou que tentará a reeleição, pretende aumentar despesas com obras e serviços públicos
Com a decisão do ministro José Múcio Monteiro de antecipar a sua aposentadoria, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) pretende indicar em dezembro o ministro da CGU (Controladoria-Geral da União), Wagner Rosário, para o TCU (Tribunal de Contas da União).
Em conversa recente com integrantes do Poder Judiciário, Bolsonaro citou Rosário como seu escolhido e disse que o ministro já demonstrou disposição de ocupar a função. A efetivação do nome é dada como certa no Palácio do Planalto.
A escolha de alguém de confiança ocorre no momento em que Bolsonaro, que já anunciou que tentará a reeleição, pretende aumentar despesas com obras e serviços públicos, o que eleva o risco de contestações no órgão colegiado, responsável por fiscalizar as contas do governo.
No início do mês passado, ministros do governo chegaram a discutir com integrantes do TCU uma brecha na lei do teto de gastos em busca de verbas para inaugurações federais. A ofensiva foi criticada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, o que levou Bolsonaro a recuar da tentativa.
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Apesar de ser um nome de perfil técnico, Rosário enfrenta resistências dentro do próprio TCU. O ministro é descrito por integrantes da Corte, em caráter reservado, como um burocrata que criou arestas ao defender pautas corporativas da CGU contra o TCU.
O principal desgaste se deu quanto às competências para firmar os acordos de leniência -espécie de delações premiadas para pessoas jurídicas.
Desde 2016, quando Rosário já ocupava o cargo de secretário-executivo da CGU, os dois órgãos divergem sobre como conduzir as negociações com empresas envolvidas em desvios e a metodologia de cálculo dos valores de ressarcimento.
Recentemente, sob a coordenação do STF (Supremo Tribunal Federal), assinaram um termo de cooperação com outras instituições para acertar procedimentos. Ainda não houve, contudo, um caso concreto de leniência em que os dois órgãos tenham trabalhado conjuntamente, nas bases pactuadas.
A indicação de Rosário também não conta com grande apoio no bloco do centrão, que chegou a tentar emplacar um nome de um deputado ou de um senador para a vaga. Hoje, boa parte dos integrantes do TCU já foi parlamentar.
Segundo um auxiliar presidencial, Bolsonaro deixou claro a deputados do centrão que a vaga de Múcio será de um nome de perfil técnico que já integra sua equipe de governo.
Com a recusa do presidente, deputados do bloco começaram a articular uma indicação para o comando da CGU, caso Rosário seja efetivado no TCU.
O TCU é composto por nove ministros titulares. A prerrogativa de indicar seis nomes é do Legislativo. O Executivo escolhe os outros três. Só uma dessas vagas, no entanto, é de livre indicação, justamente a que será aberta com a aposentadoria de Múcio.
No caso das outras duas, a escolha do Planalto tem de se dar entre integrantes do Ministério Público de Contas, que atua perante o TCU, e ministros substitutos da Corte -aqueles que participam dos julgamentos na ausência dos titulares, oriundos do quadro de auditores.
Como ocorre no Judiciário, no TCU, que é ligado ao Congresso, os ministros se aposentam aos 75 anos. Mas Múcio, que tem 71 anos e atualmente preside a corte, pretende se antecipar.
A decisão já foi comunicada por ele a Bolsonaro. Procurado pela reportagem, Rosário informou que não comentará a possibilidade de indicação.
Desde que o presidente recriou o Ministério das Comunicações, entregue a um deputado federal do PSD, as outras siglas do centrão têm cobrado o Palácio do Planalto por mais cargos de primeiro escalão na atual gestão.
Além da CGU, deputados do bloco demonstram interesse pelo Ministério da Segurança Pública, que pode ser recriado pelo presidente até o fim do ano. Bolsonaro condicionou a separação da estrutura do Ministério da Justiça à aprovação pelo Legislativo da autonomia do Banco Central.
Em conversa com aliados, o presidente disse que não vale a pena reativar a estrutura se não tiver à sua disposição mais cargos de livre nomeação. Além disso, ele não quer ser novamente criticado por elevar o atual número de ministérios, hoje em 23.