TSE abre inquérito sobre acusações de supostas fraudes em urnas e pede para STF investigar Bolsonaro
Na ação mais contundente contra o presidente Jair Bolsonaro desde que ele começou a ameaçar as eleições de 2022 e criticar a urna eletrônica, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) aprovou nesta segunda-feira (2) a abertura de um inquérito e o envio de uma notícia-crime ao STF (Supremo Tribunal Federal) para que chefe do Executivo seja investigado no inquérito da fake news.
As duas decisões foram tomadas por unanimidade pelo plenário da corte eleitoral em meio à escalada de Bolsonaro contra o sistema eletrônico de votação.
Todos os ministros da corte votaram a favor da instauração da apuração de ofício, ou seja, sem solicitação da Procuradoria-Geral Eleitoral, a exemplo do que fez o STF com o inquérito das fake news.
A sugestão de abrir um inquérito administrativo partiu do corregedor-geral Eleitoral, ministro Luís Felipe Salomão.
Já a iniciativa para enviar uma notícia-crime para investigar a live em que Bolsonaro prometia comprovar a fraude nas urnas partiu do ministro Luís Roberto Barroso.
O pedido será enviado ao ministro Alexandre de Moraes, que é relator do inquérito das fake news no STF.
Sobre o inquérito, o presidente da corte, ministro Luís Roberto Barroso, afirmou que a investigação envolverá coleta de depoimentos de "autoridades" que atacarem o sistema eleitoral, além da possibilidade de haver medidas cautelares, ou seja, mandados de busca e apreensão e outras ações para aprofundar as investigações.
A abertura do inquérito leva em consideração "relatos e declarações sem comprovação de fraudes no sistema eletrônico de votação com potenciais ataques à democracia".
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A decisão ocorre após o corregedor notificar Bolsonaro a apresentar provas das irregularidades e não ter resposta. Com o inquérito, agora, o TSE poderá "tomar as providências cabíveis para sanar ou evitar abusos e irregularidades, e, ainda, requisitar a qualquer autoridade civil ou militar a colaboração necessária ao bom desempenho de sua missão".
A portaria cita ainda que eleições transparentes "demandam pronta apuração e reprimenta de fatos que posssam caracterizar" os crimes de corrupção ou fraude, abuso de poderpolítico, uso indevido dos meios de comunicação social e propaganda eleitoral antecipada.
O escopo da investigação será a apuração de "condutas vedadas a agentes públicos e propaganda extemporânea, relativamente aos ataques contra o sistema eletrônico de votação e à legitimidade das eleições 2022".
A notícia-crime enviada ao STF pelo TSE é assinada por Barroso. A peça contém o link da live de Bolsonaro "para fins de apuração de possível conduta criminosa" e irá para o gabinete de Alexandre de Moraes, que também costuma ter embates com Bolsonaro.
As decisões foram tomadas após um discurso duro de Barroso contra Bolsonaro. O presidente do TSE disse que quem repete uma mentira muitas vezes será "perenemente prisioneiro do mal".
"A ameaça à realização de eleições é conduta antidemocrática, suprimir direitos fundamentais incluindo de natureza ambiental é conduta antidemocrática, conspurcar o debate público com desinformação, mentiras, ódios e teorias conspiratórias é conduta antidemocrática", afirmou.
O ministro classificou a live em que Bolsonaro prometia provar a fraude nas urnas como "amadorística" e que o TSE continuará a desmentir inverdades independentemente de quem as propague.
O magistrado também disse que o voto impresso defendido por Bolsonaro facilitará a ocorrência de fraudes, e não o contrário, como o presidente costuma afirmar.
"Vou explicar para pessoas de boa fé por qual razão o voto impresso não é mecanismo desejável de auditoria, e a razão é muito simples: voto impresso é menos seguro que o eletrônico, não se cria mecanismo de auditoria menos seguro que o objeto que está sendo auditado", afirmou.
Segundo Barroso, "há coisas erradas acontecendo no país" e todos precisam estar atentos: "precisamos das instituições e da sociedade civil, ambas bem alertas".
"Já superamos ciclos do atraso institucional, mas há retardatários que gostariam de voltar ao passado. E parte dessa estratégia inclui ataque às instituições", afirmou.
Mais cedo, o presidente do Supremo, Luiz Fux, já havia mandado recados a Bolsonaro, apesar de não ter citado nominalmente o presidente. Em um tom não tão ácido quanto o de Barroso, Fux disse que a harmonia e a independência entre os Poderes "não implicam em impunidade de atos que exorbitem o necessário respeito às intituições".
E alertou: "Embora diuturnamente vigilantes para com a democracia e as instituições do país, os juízes precisam vislumbrar o momento adequado para erguer a voz diante de eventuais ameaças".
O presidente da corte disse que as nações só conseguem se desenvolver mediante respeito às instituições e que "a democracia nos liberta do obscurantismo e da intolerância".
"Trago uma advertência, porém: democracia é o exercício da liberdade com responsabilidade", disse.
O magistrado também afirmou que ninguém tem superpoderes e que o Supremo está atento "aos ataques de inverdades à honra dos cidadãos que se dedicam à causa pública".
Nesta segunda-feira, o chefe do Executivo havia reforçado as críticas às urnas e os ataques a Barroso.
"Quem quer eleição suja e não democrática é o ministro Barroso. Esse cara se intitula como [quem] não pode ser criticado", declarou, em conversa com apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada.
Mais tarde, em um evento no Ministério da Cidadania, o presidente da República repetiu que há um complô para fraudar as eleições presidenciais em 2022, e citou interesse externo no Brasil. "Temos de ter eleições limpas, democráticas, que possam ser auditadas. Alguém tem duvida que outros países têm interesses no Brasil?".