Veja a checagem do discurso de Lula na ONU
O presidente discursou na Assembleia Geral das Nações Unidas nesta terça-feira (19)
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fez um discurso nesta terça-feira (19) na Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), em Nova York, nos Estados Unidos.
As Nações Unidas definiram como tema da assembleia deste ano os esforços para avançar na chamada Agenda 2030, que define 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) a serem alcançados pelos 193 países-membros da ONU até 2030.
A equipe do Fato ou Fake checou as principais declarações de Lula. Leia:
“Os 10% mais ricos da população mundial são responsáveis por quase metade de todo carbono lançado na atmosfera.”
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A declaração é #FATO. Veja por quê: Um estudo do World Inequality Lab (WIL) de 2021, realizado pelo economista francês Lucas Chancel, calculou a desigualdade nas emissões de gases de efeito estufa entre 1990 e 2019 e concluiu que os países mais ricos são os principais responsáveis pelas emissões globais. De acordo com a pesquisa, os 10% mais ricos da população global geraram quase 48% das emissões globais em 2019.
Outro estudo da Oxfam publicado em setembro de 2020 apontou que os 10% mais ricos da população mundial foram responsáveis por mais da metade (52%) das emissões de carbono entre 1990 e 2015.
“A fome, tema central da minha fala neste parlamento mundial 20 anos atrás, atinge hoje 735 milhões de seres humanos.”
A declaração é #FATO. Veja por quê: Cerca de 735 milhões de pessoas em todo o mundo enfrentaram a fome em 2022, de acordo com um relatório da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) publicado em julho de 2023.
Também é verdade que Lula falou sobre fome na ONU há 20 anos. Em 2003, discursando frente à Assembleia Geral da ONU como presidente do Brasil pela primeira vez, Lula disse que erradicar a fome era uma prioridade.
“Precisamos engajar-nos política e materialmente na única guerra da qual sairemos todos vencedores: a guerra contra a fome e à miséria”, ele afirmou na ocasião.
“Naquela época [há 20 anos], o mundo ainda não havia se dado conta da gravidade da crise climática”
#NÃOÉBEMASSIM. Veja por quê: A crise climática já é discutida há muitas décadas no mundo. Há 31 anos, em 1992, por exemplo, a ONU realizou a ECO-92, no Rio de Janeiro. O evento marcou a criação da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC) e a criação do Secretariado de Mudanças Climáticas da ONU. As 197 nações concordaram em estabilizar as concentrações de gases de efeito estufa na atmosfera para evitar interferências perigosas da atividade humana no sistema climático.
A Convenção do Clima abriu caminho para todas as negociações que vêm acontecendo há três décadas para reduzir as emissões de gases que aquecem o planeta. Na prática, os países reconheceram pela primeira vez, na Rio-92, que precisavam buscar uma solução para o problema.
Além disso, foi assinado em 1997 o primeiro tratado para frear o aquecimento global: o Protocolo de Kyoto. Na ocasião, países industrializados e economias em transição se comprometeram a reduzir as emissões de gases de efeito estufa de acordo com metas individuais. O protocolo entrou em vigor em fevereiro de 2005.
“O mundo está cada vez mais desigual. Os dez maiores bilionários possuem mais riqueza que os 40% mais pobres da humanidade.”
A declaração é #FATO. Veja por quê: O relatório “Lucrando com a dor”, da Oxfam, apontou no ano passado que os dez mais ricos do mundo têm mais riqueza que os 40% da população pobre, conforme indicou Lula no discurso na ONU. Esse percentual equivale a 3,1 bilhões de pessoas.
Também segundo o documento, existem no mundo cerca de 2,6 mil bilionários, com fortuna estimada de mais de 12,7 trilhões de dólares – 14% do PIB global. No relatório, a Oxfam mostra como as desigualdades atingiram patamares históricos depois da pandemia.
“Um trabalhador médio que está entre os 50% mais pobres da população mundial teria que trabalhar 112 anos para ganhar o que o topo da pirâmide recebe em apenas 1 ano”, constata a pesquisa.
“Ao longo dos últimos 8 meses, o desmatamento da Amazônia brasileira já foi reduzido em 48%.”
A declaração é #FATO. Veja por quê: De janeiro a agosto de 2023, as áreas sob alertas de desmatamento na Amazônia diminuíram 48% em relação ao mesmo período do ano anterior, segundo dados do sistema de monitoramento por satélite Deter, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
“87% da nossa energia elétrica provém de fontes limpas e renováveis. A geração de energia solar, eólica, biomassa, etanol e biodiesel cresce a cada ano.”
#NÃOÉBEMASSIM. Veja por quê: De fato, cerca de 87% da energia elétrica do Brasil é de fontes renováveis. Além disso, os últimos dados disponíveis mostram que a geração de energia solar, eólica, de biomassa e de etanol cresceu no país. Mas, diferente do que Lula disse, a produção de biodiesel caiu no ano passado.
Segundo dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), 87,5% da energia elétrica produzida no Brasil em 2022 veio de fontes renováveis, sendo 72,1% de hidrelétricas, 13,4% de energia eólica e 2% de energia solar. De janeiro a abril deste ano, a geração hidráulica, eólica e solar somadas responderam por 91,4%, na média, da energia elétrica distribuída pelo Sistema Interligado Nacional (SIN) à população.
Veja abaixo mais detalhes sobre a geração de cada tipo de energia citado pelo presidente:
- Solar: No primeiro semestre de 2023, o Brasil superou a marca de 10 GW de capacidade de energia por fonte solar fotovoltaica nas usinas de grande porte, segundo dados da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) e da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Se somados os sistemas de geração própria (telhados de casa, por exemplo), o valor chega a 33 GW, um aumento de 30% em relação ao ano de 2022. Os números crescem desde o início da série histórica da Absolar, iniciada em 2012.
- Eólica: A capacidade de produção de energia eólica aumentou mais de seis vezes em dez anos, de 4 GW em 2013 para 29 GW em 2023, segundo medição da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica). Todos os anos da série histórica iniciada em 2005 apresentaram crescimento em relação ao ano anterior.
- Biomassa: Dados divulgados pela União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Unica) apontam que houve um crescimento de 0,5% entre 2021 e 2022 na produção de biomassa. A expectativa do setor é que, até 2026, ocorra um acréscimo de 3%.
- Etanol: Ainda segundo a Unica, a produção de etanol na safra 23/24 alcançou 210,64 milhões de litros, contra 156,79 milhões de litros no mesmo período do ciclo 22/23. Isso representa um aumento de 34,35%.
- Biodiesel: O setor de Biodiesel, no entanto, não cresceu em 2022. De acordo com a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), a produção em 2022 foi 7,6% inferior à de 2021. No total, foram produzidos 6,27 milhões de m³. Em 2021, este valor foi de 6,27 milhões de m³. Apesar do encolhimento, a expectativa é que o setor cresça 15% neste ano.
“Estamos na metade do período de implantação [da agenda 2030] e ainda muito distantes das metas definidas. A maior parte dos objetivos de desenvolvimento sustentável caminha em ritmo lento.”
A declaração é #FATO. Veja por quê: De acordo com relatório publicado pela própria Nações Unidas em fevereiro deste ano, apenas um terço das 169 metas estabelecidas para atingir os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) está no caminho certo para ser alcançado até 2030.
A organização aponta que a pandemia da Covid-19 e as alterações climáticas foram atenuantes neste processo. Neste contexto, ações políticas são necessárias para atingir os dois terços restantes.
A ONU afirma que os ODS com mais risco de não serem alcançados são: acabar com a pobreza; reduzir desigualdades; cidades e comunidades sustentáveis; modificar a ação climática; e obter paz, justiça e instituições fortes.
No Brasil, o último Relatório Luz, promovido pela Fiocruz em Brasília, é de 2021 e aponta que houve retrocesso em ao menos 9 das 17 metas. O país retornou ao Mapa da Fome, teve crescimento da pobreza e regrediu em políticas de igualdade de gênero.
* Clara Velasco, Marina Pinhoni e Roney Domingos (g1), Carolina Nalin, Daniel Biasetto, Julia Cople, Luisa Marzullo e Luana Reis (O Globo), e Caio Sartori (Valor).