Restaurante Capincho, do chef Marcelo Schambeck, traz novos ares à cozinha do Sul do Brasil; confira
Casa existe desde 2018, valoriza insumos regionais e renova o fôlego da gastronomia porto-alegrense
Uma das minhas melhores experiências gastronômicas de 2024. Se eu tivesse somente uma linha para descrever o restaurante Capincho, dos sócios Marcelo Schambeck, Flavia Mu e Fred Muller, esta seria - bem direta ao ponto.
Conheci a casa em novembro de 2024, um mês após a reabertura do Aeroporto Salgado Filho, que ficou comprometido por causa da enchente avassaladora que assolou várias cidades no Rio Grande do Sul e ficou fechado por quase seis meses.
Localizado em uma charmosa casa de dois andares dos anos 1930, no bairro Moinhos de Vento, o Capincho (que significa capivara) pratica um novo olhar sobre a comida do Sul do País - livre dos estereótipos, valorizando o seu bioma peculiar, o pampa, aproveitando ao máximo a sazonalidade de ingredientes nativos e bebendo das principais referências da cozinha da região.
Celebração
"O Capincho é um restaurante que celebra o Sul do Brasil (Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná) e a fronteira do Rio Grande do Sul com os vizinhos Argentina e Uruguai. A gente busca apresentar esse cantinho de Brasil, que é diferente e único em paisagem, em hábitos e costumes. Revisitamos receitas e preparos que fazem parte da nossa cultura gastronômica, mas trazemos um olhar fresco, criativo, urbano e contemporâneo de quem vive numa cidade grande", define, sem titubear, o chef Marcelo Schambeck.
Para uma terra da qual só se espera churrascadas tradicionais, o Capincho é um sopro de vitalidade que respeita e se inspira no seu berço, mas fica longe de qualquer engessamento estético.
As criações com proteínas robustas, como o jarret de porco, a costela de dianteiro e o cordeiro são a mais pura herança da região, agora revisitada pela lógica contemporânea de Schambeck, que explora sem medo legumes, vegetais, cogumelos, frutas, texturas e cocções à perfeição.
É uma alegria enxergar a cozinha do Sul pelos olhos desse talentoso e entusiasmado cozinheiro que, junto a Flavia (sommelière e esposa) e Fred (mixologista), defende a identidade do seu lugar de origem e provando que é possível romper paradigmas, mesmo que eles sejam o ponto de partida do processo criativo.
No Capincho, temos uma pequena aula sobre a distante região brasileira através do acesso a ingredientes muito locais, como butiá, tomate, pinhão, guamirim e uvaia.

Imperdíveis
Com quatro trocas de menu por ano, o restaurante mantém alguns hits. A costela de dianteiro assada por 16 horas, com molho de carne, berinjela assada e conserva de berinjela é disparado o prato mais concorrido. O corte suculento vem graúdo e não oferece resistência ao corte.
Quando o assunto é suculência, não fica atrás o jarret de porco Moura, assado lentamente, ao molho de carne, mais radiche com melado de maçã, purê de maçã, maçã verde e crocante de pão, tão pouco o lombo de cordeiro grelhado, guamirim com purê de couve-flor, couve-flor, batata orgânica e cebola grelhada.
O trio é um ótimo exemplo de como o Sul do Brasil é visto por Schambeck: potente e colorido. Eu indico fortemente pedir o brioche com camarão cinza, maionese defumada, creme de queijo colonial curado, produzido em Canela, e aipo. A maciez do creme é ponto alto da composição, untuoso e preenche a boca. Não passa em brancas nuvens o rigor técnico dos preparos, bem como o senso estético de Schambeck.

Balcão
No segundo andar está o bar do Capincho, com luz baixinha, e carta de Fred Muller, mixologista que é referência em Porto Alegre, conhecido pela coquetelaria criativa. Muller é fundador do Olivos, também em Porto Alegre, e primeiro bar de coquetelaria da cidade.
Como bom profissional de bar, Muller roda o mundo para buscar referências, na época da minha visita, por exemplo, ele estava no Japão trilhando uma maratona etílica invejável. Entre os drinques que provei, o Butiazinho ficou na memória: leva cachaça, butiá e limão taiti (foto acima).
Relação
com produtores
Algo que chama a atenção na trajetória do Capincho é a relação estreita que a casa mantém com os fornecedores. Em uma manhã acompanhando o casal Marcelo e Flávia na Feira Agroecólogia do Bom Fim, no centro de Porto Alegre, vi uma proximidade que ia além do tom comercial, a conexão com os feirantes pareceu ser forte e genuína, como se fossem da mesma família.
"A Feira Agroecólogia do Bom Fim é o local de estudo dos cardápios do Capincho. Ali, ao longo dos anos, e desde os tempos do Del Barbiere (antigo restaurante de Schambeck), se construiu relações muito fortes e importantes com os agricultores que promovem trocas importantes de conhecimento, experiências e vivências diferentes", comentou Flavia Mu, que continua.
"A família Stefanoski, de Cerro Grande do Sul, é um dos nossos 'grandes carinhos'. Sempre há produtos em nossos cardápios: batatas, moranga coração (uma espécie criola muito especial). (...) Temos uma grande admiração pelo Juarez, produtor de arroz biodinâmico, que tem um produto de altíssima qualidade, pela Fran e pela família Bellé, de Antonio Prado, que fazem um trabalho fantástico com as frutíferas nativas, como uvaia, guabiroba, entre outras. Cada um é especial", completou a sommelière.
*A jornalista viajou a Porto Alegre a convite do restaurante Capincho
SERVIÇO
Capincho
Onde: Praça Dr. Maurcio Cardoso, 61 - 2 Moinhos de Vento, Porto Alegre - RS
Funcionamento: terça a sexta, das 19h às 22h30; sábado, das 12h às 15h e de 19h às 22h30
Reservas: (51) 9482-1042
Site: capinchorestaurante.com
Instagram: @capinchorestaurante