Esports é um esporte? Entenda polêmica da fala da ministra dos Esportes Ana Moser

Veja o que especialistas da área de esports pensam sobre o caso

PC Gamer. Após fala da ministra dos esportes, Ana Moser, o questionamento sobre os esportes que não envolvem práticas físicas, em específico os esporte eletrônicos, serem ou não um esporte de fato reacende o debate sobre o assunto - Pixabay

Nesta quarta-feira (18), o mundo dos games reacendeu a discussão sobre como devem ser classificados os esportes eletrônicos, ou esports. Após a primeira fala da ministra dos esportes, Ana Moser, feita em entrevista na terça-feira (10) para o UOL sobre a prática não ser considerada um esporte, gamers e especialistas e da área dos jogos repercutiram a fala. 

O que significa o termo esport?
Esports são competições organizadas por diversas entidades do setor de games, como a Blast Premier, disputadas em games eletrônicos. Um exemplo deste setor é a Major do jogo de tiro em primeira pessoa Counter Strike: Global Offensive (CS:GO). O campeonato é considerado o maior do jogo e teve o Rio de Janeiro como local para ser sediado presencialmente em 2022.

Nessas competições, os jogadores são profissionais na área de jogos, que geralente são disputados em jogos competitivos. Alguns mais famosos do segmento são o já citado CS:GO, Valorant, League of Legends e PUBG Mobile.

Sempre foi uma discussão da área se os esports entram na classificação de "esporte", já que são uma prática que não tem uma predominância de atividade física,

Contexto: O que a ministra falou?
Em entrevista para o UOL, a ministra estava em um momento para explicar as mudanças propostas pelo Plano Nacional do Desporto (PND), que segue em tramitação há cinco anos no Congresso Nacional

O PND tem o objetivo de reorganizar todo as normas do sistema desportivo brasileiro, inclusive a definição do que é e o que não é um esporte. o projeto sofreu duas mudanças significativas que envolvem não só o cenário de esports mas também o enxadrismo (área do xadrez e seus campeonatos). 

Isso pelo fato de que quando foi formulado pela Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE) do Senado, lá em 2018, o projeto definia o que poderia ser classificado como esporte, o que de acordo com o documento, tem que necessariamente ser uma “predominantemente física”.

No entanto, o texto foi revisado e modificado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) para incluir os esports e o enxadrismo. O projeto novamente sofreu mudanças quando foi para o plenário, que retirou esse ponto de inclusão e retornou a definição anterior de que "toda forma de atividade predominantemente física que, de modo informal ou organizado, tenha por objetivo atividades recreativas, a promoção da saúde, o alto rendimento esportivo ou o entretenimento".

Foi a partir desse contexto que a ministra afirmou que “o esporte eletrônico é uma indústria de entretenimento, não é esporte”. Moser ainda complementou a fala, afirmando que a área não é um objetivo do ministério.

“A questão do esporte eletrônico a nível federal ainda não é uma realidade. Não tenho essa intenção [de investir nisso]. A gente lutou ano passado, eu na minha vida pregressa, a frente da Atletas pelo Brasil fizemos uma ação muito forte junto ao legislativo par ao texto da lei geral não ser aberto o suficiente para ter o encaixe dos esportes eletrônicos. O texto está lá protegendo o esporte raiz. A definição de esporte tinha sido dado uma abertura que poderia incluir esporte eletrônico, e a gente fechou essa definição para não correr esse risco”.

Nesta quarta-feira (18), a ministra voltou a falar sobre o assunto após um tweet do ex-jogador de League of Legends Gustavo Gomes, o “Baiano”, criticar a fala de Moser sobre o cenário, citando os incentivos anunciados pelo governo francês para a prática.

O que a comunidade gamer achou disso?
A ministra rebateu o tweet feito pelo ex-jogador, afirmando que “Se você leu a matéria para além da chamada, você pode ver que são medidas interministeriais. Qual o sentido de usar o Ministério do Esporte como protagonista nesse tema? [...] Minha posição é pela ação intersetorial, exatamente como colocado na reportagem em questão, exatamente como está sendo feito na França"

Diversos criadores de conteúdo de jogos eletrônicos de campeonato de esports, à exemplo de Gaules e Casimiro criticaram o posicionamento da ministra.

Casimiro Miguel, ou apenas Casimiro, como é conhecido em suas lives de streaming de jogos e campeonatos na Twitch e no YouTube, rebateu a primeira fala da ministra. 

Segundo o streamer, a problemática é de onde vai vir os investimentos para a área. "Vai colocar o esport em qual pasta? Porque precisa ter investimento. Ela podia só ter mais cuidado na fala dela, porque desrespeitou muita gente. A discussão é muito complexa para ser encerrada numa frase ruim"

Já o streamer Alexandre "Gaules", ironizou e afirmou que “a parte boa disso é que a gente nunca precisou e nem vai precisar dessa galera pra ficar dizendo se é esporte ou se não é, saca?”.

O que dizem os especialistas?
Especialistas do mundo dos jogos e esportes eletrônicos apontam para a necessidade de renovação sobre o que significa esports por parte do ministério e principalmente a separação de entendimento sobre o que são os games, aqueles que jogamos no dia-a-dia, e o que são esports. 

Wagner Damásio, é empresário comercial de Pernambuco e atuante no cenário de esportes eletrônicos e aponta o descaso da iniciativa pública com a área. Administrador da Influence Chemin, equipe de esports voltada para o PUBG Mobile, ele conta que o time era Pernambucano, natural do Recife, mas teve que se mudar para São Paulo, justamente pela falta de financiamento. 

Wagner Damásio, administrador da Influenc Chemin, time de PUBG MobileWagner Damásio, administrador da Influenc Chemin, time de PUBG Mobile - Divulgação/ Linkedin

“Nós até tentamos o apoio da iniciativa pública da nossa região, mas não conseguimos ser atendidos, mesmo com tantas conquistas, mesmo levando o nome do Pernambuco e de Recife tão longe,  e ai acabou que optamos por migrar para São Paulo,  que já tem um programa maior de incentivo e existe projeções futuras de que seja de fato consolidado na área, mas se tratando de Pernambuco e do Nordeste, se a gente que é a maior organização mobile daqui não teve incentivo nenhum, imagino que nenhuma outra tenha”.

Damásio ainda complementa que, mesmo o financiamento público não sendo a principal fonte, não é pelo dinheiro, mas pelo reconhecimento.

“Nós temos atletas que representam o Brasil a nível mundial e não conseguem um reconhecimento do próprio governo, do próprio país, não conseguem entrar nesses programas de incentivo de bolsa atleta”, afirma o empresário.

Cynthya Rodrigues, co-fundadora da G4B, startup brasileira especializada em negócios para os segmentos de Games, esports e Entretenimento, por outro lado, comentou sobre a necessidade de incentivos por parte do Governo Federal, pelo fato da pasta alcançar áreas que a iniciativa privada não alcança.

Cynthya Rodrigues, co-fundadora da G4B, startup brasileira voltada para os e-Sports, Games e entretenimentoCynthya Rodrigues, co-fundadora da G4B, startup brasileira voltada para os esports, Games e entretenimento - Divulgação

“A mudança mesmo impactará quem mais precisa, em locais mais afastados e com pouco olhar e fomento da iniciativa privada. Lá onde (talvez) nunca teriam acesso a tais oportunidades, se não fosse por um incentivo governamental”, afirma Rodrigues. 

Em sua fala ela ainda volta na questão de que é necessário a diferenciação com relação ao que é Game "casual" e o que é esport. 

“Quando falamos apenas de jogar de forma casual, concordo que seja algo bem mais relacionado a entretenimento ou ciência e Tecnologia, já que não existe nenhum compromisso formal ou disputas nesse formato. Por outro lado, quando falamos de esports, que é a pauta central, estamos falando de torneios formais, competições com regras preestabelecidas e, de fato, uma profissão reconhecida, por conta de sua rotina mental e física”.

Ambos especialistas concordam nesse ponto de separação e apontam a similaridade dos esports com a prática esportiva, que exige segundo eles, também exige uma rotina alimentar, exercícios físicos e mentais, como aponta Rodrigues.

Além de que “existe sim, o gamer que está ali para se divertir, como existe o jogador de futebol peladeiro que vai às quartas para se divertir, mas existe o gamer que faz disso um trabalho, que tem carga horária de trabalho para cumprir, que viaja para representar o país, o estado, o município, então as pessoas precisam também aprender a separar”, afirma Damásio.

Como a fala da ministra impacta o incentivo público para os esports?
Apesar da negativa da fala da ministra com relação a futuros incentivos por parte do ministério para a área, isso não necessariamente impede que as outras esferas do poder público, como as municipais, realizem incentivos para os esports, quer seja de forma autônoma ou em conjunto com a iniciativa privada.

Segundo a Prefeitura do Recife, não cabe à prefeitura colocar em lei que o esport é um esporte ou não, isso de fato fica a cargo do Ministério dos Esportes, por ser uma diretriz federal. Porém, fornecer o incentivo é algo que dá para ser feito sim, e é inclusive, segundo nota da Secretaria de Esportes do Recife (Sesp), uma proposta futura da administração.

Em nota, a Sesp afirma que “está aberta ao diálogo com a comunidade” e ainda completa que “há entendimentos em curso com parceiros privados para que o Recife possa sediar eventos esportivos dessa modalidade, utilizando o Ginásio de Esportes Geraldo Magalhães (Geraldão) como uma das possíveis sedes para os torneios, ao longo deste ano de 2023”.

O Blog de Tecnologia e Games tentou contato com o Ministério dos Esportes, mas não recebeu resposta até a publicação desta matéria.

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